Plinio Corrêa de Oliveira
Campo Santa Maria Formosa, em Veneza, 1741 – Michele Marieschi, séc. XVIII. Museu Correr, Veneza.
Em minha sala de trabalho tenho um quadro reproduzindo uma pequena praça de Veneza. Ela tem um charme que toca nos sentidos, inclusive por seus defeitos, revelando a ‘alma’ e o espírito veneziano. Esse charme impregna o conjunto da praça, a igreja no fundo, as casas e os personagens ali presentes, cujas atitudes características dão a impressão de estarem saindo de alguma representação teatral.
A igreja, em estilo que parece do século XVII, irradia alguma paz ao conjunto. É quase o contrário do que transparece nas pessoas, entretanto acaba envolvendo-as. Por uma porta aberta da igreja se percebe algo de meditativo e sério, pela presença do Santíssimo Sacramento no sacrário interno, riquíssimo em graças. É o mesmo imponderável de certas igrejas da Itália.
Essa Veneza do século XVIII tem algo que lembra remotamente a dignidade e distinção próprias do Ancien Régime. Nas pessoas transparece também a frivolidade social daquela época. São habituadas a morar em Veneza e conviver com casas de aspecto um tanto tristonho, com tracinhos de palácio. Elas gostam do estilo, que as eleva a um nível mais alto.
Esses vários aspectos, onde se misturam laivos de séculos anteriores com algo do século que viria, influenciam as almas dos que ali estão, ou que moram na praça.
A mistura de todos esses aspectos lembra certos arranjos de sorvetes, quando a groselha e o creme vão se derretendo, alternando dentro do copo suas cores respectivas. Na praça, os seus vários aspectos formam laivos psicológicos — um ice-cream soda indefinido dentro de um copo, que seria aquela pracinha.