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Eleições peruanas: maré vermelha?

Julio Loredo de Ízcue Os meios de comunicação apresentam a vitória do candidato da extrema-esquerda, Pedro Castillo [Foto], nas recentes eleições presidenciais no Peru, como a enésima prova da derrapagem inexorável do continente ibero-americano para o socialismo. Embora essa tendência seja tristemente real (escrevemos recentemente um artigo sobre isso para o público italiano),1 e haja muito com o que se preocupar, o empreendimento eleitoral de Castillo deve ser encarado como um incidente num conjunto muito maior.

Resultado ainda pendente

No momento em que escrevemos, os dados oficiais do ONPE (Escritório Nacional de Processos Eleitorais), com quase 100% dos votos apurados, dão a Pedro Castillo a vitória com 50,15% dos votos, contra 49,85% de Keiko Fujimori. Isso corresponde a uma pequena margem de aproximadamente 30.000 votos. Chama a atenção o elevado número de atas com votos contestados, nos círculos eleitorais em que a candidata Keiko Fujimori recebeu mais votos. Aí começa a primeira perplexidade. Na verdade, aumentam os rumores de fraudes massivas a favor do candidato marxista. Sete escritórios de advocacia em Lima examinaram as atas, com a participação de centenas de voluntários em todo o país. Encontraram inúmeras irregularidades, contestando assim 802 assembleias de voto perante os júris eleitorais, envolvendo mais de 200 mil votos. Na cidade de Cusco, ‘fortaleza’ de Castillo, os advogados encontraram cerca de 45.000 votos suspeitos, muitos com assinaturas que não correspondiam ao registro de identidade nacional. Só não contestaram número maior devido à polêmica disposição que encerrou o prazo após tê-lo ampliado.

50% dos votos para candidato mais odiado

É impossível contar num simples artigo a saga da família Fujimori, que começou com Alberto, pai de Keiko, presidente do Peru por dois períodos. A guerra de propaganda contra ele tem algo de surreal. Poucos personagens foram tão difamados, vilipendiados, perseguidos. Apesar das evidentes luzes e inevitáveis sombras em seu governo, não o perdoa a esquerda por ter desmantelado a revolução socialista militar de Velasco Alvarado e pela redução do terrorismo comunista à sua mínima expressão. Essa guerra não cessou até que ele foi levado para a prisão, onde cumpre uma pena severa. Apesar de sua idade e deterioração da saúde, todos os pedidos de libertação foram rejeitados: o ‘monstro’ deve permanecer trancado! Depois de destruir o pai, essa enorme máquina de guerra descarregou artilharia contra sua filha e herdeira. No meio da campanha eleitoral, um promotor pediu 30 anos de prisão para Keiko; e de fato ela já passou 16 meses em prisão ‘preventiva’ durante a investigação. Para a propaganda, ela é filha do monstro, da corrupção encarnada, do mal absoluto. Só um peruano pode perceber quão visceral e generalizado se tornou esse ódio. Apesar dessa rejeição massiva instilada pela propaganda, Keiko conseguiu até o momento 49,85% dos votos válidos. Diante disso, o dado eleitoral importante é que, disputando com Keiko, a candidata propagandisticamente mais odiada da história do Peru, a muito custo Castillo obteve 50% dos votos. Isso diz muito sobre a situação real da opinião pública peruana. Significa que a rejeição ao comunismo é tão forte, que em muitos casos supera até mesmo o ódio contra Keiko. Opositores históricos de Fujimori, como Mario Vargas Llosa, ganhador do Prêmio Nobel, falaram também a favor da candidata da Fuerza Popular. Isso também significa que nem todos os votos de Pedro Castillo são da esquerda. Analistas estimam que pelo menos 30% deles são votos anti-Fujimori. Ou seja, no Peru não há maioria de esquerda; muito pelo contrário, pois no primeiro turno os candidatos de centro-direita somaram 68% dos votos.

Reação anticomunista

O fenômeno mais interessante que se manifestou durante as eleições é a reação anticomunista muito forte, especialmente entre os jovens. Assim que se tornou evidente o perigo real de o Peru sofrer o mesmo destino da Venezuela, um grito se ergueu das profundezas da opinião pública: Comunismo nunca! Nas cidades, cartazes anticomunistas, rosários contra o comunismo em praça pública, camisetas com slogans anticomunistas, folhetos com textos do Magistério Pontifício contra o comunismo, frases de Nossa Senhora de Fátima condenando "os erros da Rússia", que se espalhariam pelo mundo. Em muitas cidades, incluindo a capital, grandes manifestações populares foram realizadas contra o comunismo, enquanto vários jogadores da seleção nacional de futebol fizeram declarações anticomunistas. Esta reação foi especialmente forte entre os jovens, revelando a existência de um setor amplo, informado e militante que não teme expor-se politicamente para evitar que o país caia no comunismo. É interessante notar que esta geração não experimentou o inferno da ditadura Velasco Alvarado. A rejeição ao comunismo, portanto, é baseada em princípios. Oferece-nos um retorno a este fenômeno muito interessante da opinião pública, visível em quase todas as partes da América Latina, e que funciona como um contrapeso à ‘maré vermelha’marxista que invade a América Latina. Página seguinte