| PALAVRA DO SACERDOTE |

É no Batismo que recebemos nossos anjos da guarda?

Padre David Francisquini

Pergunta — Ouvi dizer que recebemos nossos anjos da guarda no batismo. Isso é verdade? Estranhei porque, se fosse verdade, significaria que os bebês não cristãos não têm anjos da guarda. O senhor poderia elucidar isso?

Resposta — Antes de entrarmos na questão específica levantada pelo nosso consulente, convém dizer algumas palavras sobre a existência e a missão dos anjos, pois isso ajudará a compreender melhor a assistência que eles dão aos homens dos quais eles têm a guarda.

É dogma de fé que, fora do mundo visível, Deus criou um reino de espíritos invisíveis. O IV Concílio de Latrão (1215) afirma expressamente a existência dos anjos e coloca a “criatura espiritual” antes da “criatura corporal”, afirmação essa repetida nos mesmos termos pelo Concílio Vaticano I (1869-1870). Nas Sagradas Escrituras, esses seres espirituais são designados por vários nomes: anjos ou mensageiros, espíritos, filhos de Deus, guardiões, santos habitantes do Céu, legiões celestes.

Os anjos no Antigo Testamento

Os ateus racionalistas do século XIX pretenderam que Israel teria introduzido a doutrina dos anjos depois do exílio na Babilônia, sob a influência da religião dos persas. Porém, já o primeiro livro da Bíblia — bem antes, portanto, desse cativeiro — narra que os querubins são os guardiões do Paraíso terrestre (Gen 3, 24); que três anjos apareceram a Abraão (Gen 18); que um anjo foi quem deteve sua mão para não sacrificar Isaac (Gen 22); que outro anjo foi prometido a Eliezer de Damasco para ajudá-lo na escolha de uma mulher para Isaac (Gen 24, 7); que Lot foi visitado por dois anjos que instaram sua família a abandonar a cidade e encegueceram os sodomitas (Gen 29), e que uma multidão de anjos apareceu subindo e descendo numa escada apoiada na terra e que tocava com o cimo o Céu (Gen 28, 12).

São igualmente numerosas as passagens do livro do Êxodo, dos Números e dos Juízes que falam dos anjos, os quais também se manifestam aos Profetas. No livro de Tobias, o anjo que o acompanhou e o protegeu apresenta-se dizendo: “Eu sou o anjo Rafael, um dos sete que assistimos na presença do Senhor” (Tb 12, 15). O livro do profeta Daniel fala do anjo Miguel (Dan 10, 13 e 22) e do anjo Gabriel (Dan 8, 16 e 9,21).

Os anjos no Novo Testamento

No Novo Testamento, além da passagem da Anunciação feita por São Gabriel a Nossa Senhora (Lc 1, 19 e 26) e da cena da Natividade em que uma coorte de anjos canta os louvores de Deus (Lc 2, 9-14), vemos Nosso Senhor falar amiúde dos anjos (Mc 12, 25 e 13, 32; Mt 18, 10; 22, 30 e 26, 53; Lc 16, 22 e Jo 1, 51). Eles também aparecem na vida de São Pedro (At 10, 3 e 12, 7-11) e de São Paulo (At 27, 23), os quais os mencionam nas suas epístolas. Por sua vez, São João fala dos anjos praticamente em cada página do Apocalipse.

Os Padres da Igreja são unânimes a respeito da existência e do caráter criado dos anjos, os quais são frequentemente nomeados na liturgia. O primeiro estudo completo sobre os anjos foi escrito pelo Pseudo-Dionísio (De caelisti hierarchia), que fala de sua natureza, de seus dons e de sua missão.

Santo Tomás de Aquino prova a existência dos anjos do ponto de vista da razão natural, afirmando que acima do mundo material se eleva o mundo humano, mistura de matéria e espírito. Essa ordem postula, acima do mundo humano, um reino de puros espíritos, seres sem corpo, que ele chama de “substâncias intelectuais” (Suma contra os Gentios, II, 48-57). É neles que o Ser divino encontra sua maior e mais perfeita semelhança, e como eles Lhe são mais próximos pela essência, também estão mais próximos pelo lugar, uma vez que habitam o Céu. De outra parte, a finalidade da Criação é dar glória a Deus, mas esse fim não pode ser alcançado inteiramente sem anjos que O conheçam sem as limitações do homem.

Enquanto criaturas espirituais dotadas de razão e destinadas à visão eterna de Deus, o Criador lhes concedeu as graças necessárias para prepará-los e, depois de uma prova, os elevou ao estado sobrenatural e os confirmou em graça. Os que não passaram pela prova, revoltando-se contra Deus ao grito de “Non serviam” (Não servirei) de Lúcifer, transformaram-se em demônios, habitam o inferno e tentam destruir a obra de Deus tentando os homens.

Todos têm um anjo da guarda desde o nascimento

Por isso os anjos foram colocados ao lado dos homens, para protegê-los e assisti-los. São Paulo é categórico: “Não são todos os anjos espíritos ao serviço de Deus, que lhes confia missões para o bem daqueles que devem herdar a salvação?” (Heb 1, 14). Eles cumprem essa tarefa transmitindo aos homens as instruções divinas — como já foi visto nas passagens da Bíblia citadas acima —, bem como transmitindo a Deus as orações dos homens e os protegendo, segundo diz o Salmista: “Nenhum mal te atingirá, nenhum flagelo chegará à tua tenda, porque ele mandou aos seus anjos que te guardem em todos os teus caminhos” (Sal 90, 10-11). Nesse sentindo, convém muito rezar a breve oração, muito eficaz e importante, que reproduzimos ao lado, e também a oração da página 13.

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