Maria, /é Rainha do Céu, /e vai ser Mãe do Verbo Divino”.
De dentro se ouve cantar: “És tu José? Tua esposa é Maria? / Entrai, peregrinos, /não vos conhecia”.
Na rua, então, entoam: “Deus te pague, senhor, pela tua caridade / e te encha o Céu de felicidade”.
Do interior da casa as vozes se aproximam: “Ditosa a casa que neste dia hospeda / a Virgem pura, a formosa Maria”.
Quando as portas se abrem, todos entoam em coro: “Entrai, Santos Peregrinos, /aceitai esta casinha que, apesar de pobre morada, / vos dou de coração”.
A “pastorela”, ou procissão, ingressa na casa precedidos pelo “mistério” — imagens de Jesus e Maria, ou pessoas fantasiadas representando-os, e até um anjo e um burrinho, segundo a piedosa fantasia.
Todos juntos então rezam um terço, entoam ladainhas e/ou canções natalinas. Depois servem-se frutas da estação, como tangerinas, cana-de-açúcar e tejocotes (pequenas maçãs locais), além de doces e amendoins, um quentão — nesta época faz frio na região — feito com frutas como goiaba, cana-de-açúcar, maçã e canela. Variam de acordo com cada receita de família e com o toque pessoal de quem prepara a bebida.
Chega então o momento preferido das crianças. Elas devem destruir a “pinhata”, que consiste num pote de barro, ou papelão com uma estrutura de arame forrada de papel machê intensamente colorido.
Ela deve ter o formato de uma estrela de sete pontas em que cada uma representa um pecado capital, ou o próprio diabo, que com suas cores vivas e enfeites seduz a alma inocente, levando-a ao pecado.
Cada criança com os olhos vendados representa o fiel que, embora sem ver, com a virtude teológica da fé derrota o pecado recuperando o dom sobrenatural da graça. Com um bastão na mão, símbolo do poder do próprio Deus que dá forças para vencer as tentações, procura acertar golpes na “pinhata” pendurada do teto. Antes de começar, as crianças são viradas três vezes, em memória dos trinta e três anos que Cristo viveu.
Quando alguma criança acerta e quebra a “pinhata”, todos celebram a vitória do Bem sobre o Mal. Então chovem sobre as crianças guloseimas, doces e frutas de que a “pinhata” está repleta, simbolizando as graças e os dons de Deus que nos irriga com seu amor e que, ao destruir o mal, obtém para nós as bênçãos do Céu. Em certas cidades, a tradição manda reproduzir a cena no átrio da igreja, reunindo todos os habitantes da vila ou comunidade, mudando as famílias a cada dia da novena. As famílias são responsáveis por oferecer a cada um dos participantes frutas da época, doces, bebidas e alguns petiscos.
Por fim, no final da “pousada”, há troca de lembranças na forma de saquinhos com doces, frutas e salgadinhos.
D
e 1793 a 1800, a região de Fougères, no nordeste da França, foi palco da luta épica dos Chouans — camponeses que se levantaram contra a Revolução Francesa em defesa da Monarquia e da Igreja. Numa noite de inverno de 1795, uma coluna de militares da República revolucionária caminhava por uma trilha através de uma floresta.*
Estavam entediados e cansados pelo peso das mochilas e mosquetes que carregavam nas costas. Levavam como prisioneiro um camponês, um jovem chouan, que tinha tentado emboscá-los. O camponês, depois de atacar os revolucionários com seu mosquete, havia sido capturado e desarmado. Ele ia sendo puxado pelos militares: mãos amarradas, semblante desolado. Dois soldados amarraram cordas em seus pulsos e por aí o mantinham preso.
Na encruzilhada de Servilliers, o sargento ordenou uma parada. Os homens, exaustos, empilharam suas armas e jogaram suas mochilas na grama. Juntaram galhos e folhas secas com as quais fizeram uma fogueira no meio da clareira. Ao mesmo tempo, dois deles amarraram o camponês a uma árvore.
O chouan atentamente observava tudo a sua volta. Não tremia, nem dizia uma palavra, mas a angústia transparecia em suas feições: a morte se aproximava.
Sua apreensão foi notada por um dos Azuis, como eram conhecidos os soldados da Revolução. Este homem havia sido destacado para ficar de olho no prisioneiro. Era um adolescente magro, com uma língua zombeteira e cortante. Ele provocou o prisioneiro, dizendo com forte sotaque parisiense:
— Não tenhas medo, rapaz! Não morrerás agora; tens ainda seis horas de vida...
Suas palavras foram interrompidas por uma voz sonora e áspera do outro lado da clareira.
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