| O SÉCULO DA GUERRA... | (Continuação da página 1)

ao Bispo, ao Arcebispo, ao Patriarca, ao Cardeal e passemos sem maiores referências pelas diferenças entre os Cônegos honorários e catedráticos, as diversas modalidades de Monsenhorato, os Bispos titulares, auxiliares, coadjutores, diocesanos, os Arcebispos-Bispos e os Metropolitanos, os Cardeais Diáconos, Cardeais Presbíteros e Cardeais Bispos até o Papa, que reúne em si a plenitude do governo, do magistério, do sacerdócio e da honra, quantos graus, quantos matizes, que inexaurível riqueza de desigualdades!

6 — Chegamos aqui à pedra de toque desta parte de nossa exposição. Há uma virtude pela qual o homem ama a superioridade infinita de Deus, e a superioridade finita das criaturas que Deus constituiu acima dele como talento, formosura, poder, riqueza ou virtude: é a humildade. Esta virtude nos leva a sentir gáudio pelo que os outros têm a mais do que nós. Num mundo onde haja humildade, nada de mais amável e compreensível do que a hierarquia. Desde que a humildade cesse de existir, nada mais inevitável do que o ódio à hierarquia, a sede de nivelamento e consequentemente, a Revolução. Humildade e hierarquia; orgulho e Revolução são, pois, termos conexos. Daí o fato de que a primeira Revolução tenha sido o "Non serviam" do primeiro, do grande, do eterno orgulhoso

7 — Explodindo no seio de uma Igreja hierárquica em todas as suas concepções, em toda a sua doutrina, em todo o seu ser, o que fez o protestantismo? A obra do orgulho e da revolta: nivelou todas as seitas, afirmando o livre exame, negaram o Magistério da Igreja, fazendo de cada homem o Papa de si mesmo. Por suas concepções sobre a Missa e o Sacerdócio, reduziram o clérigo a um mero delegado dos fiéis, e fizeram de cada fiel o seu próprio sacerdote. Na aparência, continuou a haver clérigos e leigos entre os protestantes: mas trata-se de uma diferença meramente acidental, e não como a que separa, na Igreja Católica, o ungido do Senhor do resto dos fiéis. Neste Clero assim diminuído em sua essência, os protestantes ainda exerceram a devastação de sua ação niveladora. Abolido o Papa, seitas houve que aboliram os Bispos e outras chegaram a prescindir praticamente dos Presbíteros. As ordens religiosas foram extintas. Até nas relações entre a Igreja Triunfante e a Igreja Militante entrou o furor igualitário, negou-se o culto dos Anjos e dos Santos, a Realeza de Maria sobre toda a criação

8 — A sociedade civil estava organizada na Idade Média em moldes sensivelmente parecidos com a Igreja. No ápice, uma suprema cabeça, o Imperador Romano Alemão. Abaixo dele, os Reis, e sucessivamente os vários degraus da aristocracia feudal, e a plebe, dividida ela própria em vários níveis sociais e econômicos até o servo na lavoura, ou, na indústria, o aprendiz das corporações

Conferido o direito da cidadania na Europa do protestantismo e, pois, ao espírito de revolta e nivelamento seria cabível que ele deixasse incólume no plano temporal um tipo de organização que acabava de derrubar na esfera espiritual?

A causa mais profunda da Revolução Francesa está nisto. O "dogma" do livre exame teria de produzir cedo ou tarde o "dogma" da soberania popular. A queda do Sacro Império, a generalização do sistema republicano na Europa, a abolição dos privilégios da aristocracia, a introdução da igualdade absoluta na esfera política pelo sufrágio universal: tudo isto se fez sob o sopro de um misticismo político igualitário que é manifestamente filho do misticismo igualitário religioso dos protestantes

9 — A única desigualdade que restou depois da Revolução Francesa foi a financeira. Qual o herdeiro da Revolução que estendesse para esta esfera o Nivelamento? O comunismo. No dia em que este vencesse, a obra niveladora de Lutero teria triunfado em toda a linha. Não haveria mais no mundo clérigos, nem nobres, nem patrões. Deus criou o universo hierarquizado. O demônio teria abolido a hierarquia na sociedade humana

A Fé e a Revolução

A Fé, outro dos traços essenciais da alma medieval, é, ela também sob certo aspecto um ato de humildade. O homem aceita as verdades que Deus lhe revela, não porque as tenha descoberto pelas meras forças de sua razão ou de seus sentidos mas simplesmente porque Deus lhas revelou

Claro está que o orgulho haveria de se revoltar contra a Revelação. Daí a recusa protestante de crer na Presença Real que os sentidos não percebem. Daí também a recusa de admitir no ensinamento do Papa uma infalibilidade ante a qual a razão tem que se dobrar. Daí, também, a formação de uma exegese bíblica cada vez mais racionalista, que acabou por negar a Divindade de Nosso Senhor Jesus Cristo, e a própria existência de um Deus pessoal. O protestantismo degenerou em deísmo, o deísmo em panteísmo. E o panteísmo o que é senão a afirmação de que tudo é Deus, ou seja, o triunfo da igualdade no cosmos? Pois se tudo é divino por essência, por natureza, tudo é essencialmente, naturalmente igual entre si, essencial e naturalmente igual a Deus

É para o mare magno do panteísmo que deságuam igualmente todas as correntes da filosofia moderna, originadas direta ou indiretamente do racionalismo e ceticismo protestante, e que correm parelhas neste sentido com o pensamento reformista do qual nasceu o mundo moderno.

Pureza e Revolução

Para completar este quadro, falta apenas dizer uma palavra sobre a castidade

Segunda a doutrina católica, as relações entre os sexos só são lícitas no casamento. Este por sua vez, é monogâmico e indissolúvel. O estado de castidade perfeita é exigido dos Clérigos e dos Religiosos, e altamente louvável nos leigos. Esta doutrina é o triunfo da disciplina dos sentidos

O protestantismo revolucionário por essência e, pois, inimigo de todos os freios, começou por abolir o celibato sacerdotal e religioso, e instituir o divórcio. Lutero chegou até a consentir na poligamia quando se tratasse de Príncipes. A Revolução Francesa iniciou o movimento de introdução do divórcio na legislação civil dos países católicos. Faltava dar um passo, de que Marx se incumbe resolutamente: abolir o próprio casamento. É o paroxismo da revolta dos sentidos contra toda a autoridade, todo o freio, toda a lei

O epílogo

Panteísmo, igualitarismo político, social e econômico absoluto, amor livre: eis o tríplice fim a que nos conduz um movimento velho de mais de quatro séculos

Qual o papel preciso de nossa época neste trágico encadeamento de fatos?

O que caracteriza esta revolução de quatrocentos anos é o processo eminentemente gradual de seu desenvolvimento. Nos séculos XVI, XVII e XVIII, foi ela preponderantemente religiosa: as instituições políticas continuavam mais ou menos intactas. De 1789 até fins do século XIX, foi ela essencialmente política. Daí por diante, invadiu a economia, único campo da vida social que lhe restava convulsionar. Paralelamente, dos séculos XVI a XVIII passou-se do Cristianismo para o Deísmo. O século XIX marcou o apogeu do ateísmo. O século XIX é propriamente o século do panteísmo. Por fim do século XVI ao século XIX foi a era de expansão do ideal divorcista. O século XX é o grande século da expansão do amor livre

Esta grande Revolução não faz saltos. Ela levou quatrocentos anos para chegar até onde chegou. E forçoso é reconhecer que ela parece hoje bem próxima de sua meta

A grande luta

Este é o ponto que importa reter, se queremos fixar uma ideia exata a respeito dos dias em que vivemos. Todas as tendências niveladoras e revolucionárias dos séculos passados chegaram hoje ao sumum de sua exasperação. Não se pode ser mais radical na linha do orgulho e da revolução, do que proclamando a igualdade entre Deus e os homens, e a total igualdade dos homens no campo político, econômico e social. Não se pode levar mais longe a luxúria, do que instituindo o amor livre

É certo que estas tendências não chegaram ainda a seu completo triunfo. Para começarmos pelo que é secundário ou até secundaríssimo, notemos antes de tudo que, mesmo fora da Igreja nem tudo, ainda é panteísmo, igualitarismo e amor livre. E, principalmente, observemos que aí está, em certo sentido mais frondosa do que nunca a Santa Igreja, no esplendor de sua santidade, de sua unidade, de sua catolicidade. Quatro séculos de uma investida ciclópica não impediram que em meio de reveses e dores sem nome ela continuasse a se dilatar

Um choque entre a Revolução que não pode parar, não pode recuar, e a Igreja que ela apesar de tudo não conseguiu vencer, parece inevitável em nossos dias. Outrora, houve entrechoques sérios entre a Igreja e a Revolução, em várias etapas desta. Mas como o vírus revolucionário não tinha atingido o auge de seu paroxismo, foi possível conseguir acomodações, recuos, arranjos, sem ferir propriamente princípios. Hoje isto é impossível, porque a exasperação revolucionária levou as coisas a um ponto tal que não há outra possibilidade senão a luta de extermínio. Não será necessária muita perspicácia para discernir uma relação entre este conflito titânico e a grande era de guerras e convulsões que parece aproximar-se de nós? As hostes do Anticristo vermelho cobrem todo o território que vai da Indochina ao Elba. Partidos comunistas numerosos e organizados se agitam nas entranhas do mundo ocidental. Mais ainda: as instituições dos países ocidentais evoluem para o socialismo que outra coisa não é senão comunismo camuflado. A filosofia e a cultura do Ocidente tendem para o panteísmo

Os costumes decadentes do Ocidente tendem para o amor livre. E — o que é ainda mais triste — dentro das próprias fileiras católicas as infiltrações deste espírito são tão profundas que exigiram que Pio XII tomasse uma série de medidas para preservar os fiéis contra este terrível mal

Haveria, pois, muita ingenuidade em imaginar que tudo quanto é anticatólico está além do Elba

Mas o certo é que a vitória dos vermelhos seria hoje um desastre para o Ocidente como foi para o Oriente a vitória de Mao-Tsé-Tung sobre Chang-Kai-Chec

Guerra de religião

A guerra, a morte e o pecado estão se apresentando para devastar novamente o mundo, desta vez em proporções maiores do que nunca. Em 1513, representou-os o talento incomparável de Dürer sob a forma de um cavaleiro que parte para a guerra, revestido de armadura completa, e acompanhado da morte e do pecado, este último personificado em um unicórnio. A Europa já então imersa nas agitações que precederam a Pseudo-Reforma, se encaminhava para a era trágica das guerras religiosas, políticas e sociais que o protestantismo desencadeou

A próxima guerra, sem ser explícita e diretamente uma guerra de Religião, afetará de tal maneira os mais sagrados interesses da Igreja que um verdadeiro católico não pode deixar de ver nela, principalmente o aspecto religioso. E o morticínio que se desencadeará será por certo incomparavelmente mais devastador do que os dos séculos anteriores

Quem vencerá? A Igreja?

Não são róseas as nuvens que temos diante de nós. Mas uma certeza invencível nos anima, de que não só a Igreja — como é óbvio dada a promessa divina — não desaparecerá, mas que alcançará em nossos dias um triunfo maior do que o de Lepanto

Como? Quando? O futuro a Deus pertence. Muita causa de tristeza e apreensão se nos depara ao olhar até mesmo para alguns irmãos na Fé. Ao calor da luta, é possível e até provável que tenhamos terríveis decepções. Mas é bem certo que o Espírito Santo continua a suscitar na Igreja admiráveis e indomáveis energias espirituais de Fé, pureza, obediência e dedicação, que no momento oportuno cobrirão mais uma vez de glória o nome cristão

O século XX será, não só o século da grande luta, mas sobretudo o século do imenso triunfo.

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O SR. OSVALDO CHATEAUBRIAND E OS "PROTOCOLOS DOS SÁBIOS DE SION"

Para quem observa os fatos contemporâneos sem vendas nos olhos e sem paixão política, fica patente a grande, a incomensurável ajuda que Hitler e o nacional-socialismo prestaram à causa de Israel, com o seu antissemitismo dirigido contra o judeu da classe média para baixo. Sem Hitler, sem Gestapo, sem os horrores dos campos de concentração, o Estado de Israel seria uma coisa que teria que ser adiada indefinidamente, por falta de apropriado "background".

Além dessa ajuda direta, o antissemitismo nazista prestou outro inestimável concurso indireto à causa do semitismo. Por isso mesmo que o antissemitismo é injusto, sendo expressamente condenado pela Santa Sé, fez-se com esse antissemitismo nazista uma cortina de fumaça tendente a defender o semitismo, ou a causa de Israel, contra qualquer gênero de ataques. O judeu passou a ser a grande vítima indefesa. Não se pode nem sequer fazer alusão, por exemplo, aos "Protocolos dos Sábios de Sion", sem receber logo a pecha de antissemita. E assim o sionismo vai sendo promovido sem alarido e sem maiores tropeços no mundo ocidental.

Ora, que os judeus têm um plano de dominação universal, é um fato que não deixa dúvidas, pelo menos no espírito dos católicos esclarecidos. E desse fato tivemos recentemente uma confirmação curiosa e bem pública e notória. O sr. Osvaldo Chateaubriand, dos Diários Associados, foi intimado, segundo sua própria expressão, a fazer o elogio da revista "Brasil-Israel". Até aqui nada de mais, pois o sr. Osvaldo Chateaubriand, com sua pena versátil, tem se ocupado dos mais variados assuntos em sua vida de jornalista profissional.

O importante é que no correr desse elogio vem a seguinte revelação:

"Tão forte é a consciência desse povo da raça semita que conseguiu atravessar os séculos, debaixo de tempestades e de fogo, mantendo a sua unidade física, moral e religiosa. O judeu não é hoje diferente do de milênios passados. É ávido de infinito como os seus maiores, e o messianismo, no seu sentido histórico, é a sua fé. Dominará o universo e imporá aos filhos do ocidente os cânones da sua crença". (Secção livre do "Diário de São Paulo", de 27 de janeiro de 1951).

Como se vê, o sr. Osvaldo Chateaubriand não podia ser mais conciso nem mais claro. O judeu dominará o universo e imporá aos cristãos do ocidente os cânones da sua crença, que é o messianismo, no seu sentido histórico. Não é essa a finalidade ostensiva dos tais famigerados "Protocolos dos Sábios de Sion"? E como se pode conceber a imposição desse domínio universal, sem um ciclópico e inteligente trabalho de preparação nos moldes tão sabiamente descritos no livro revelado ao mundo por Sergio Nilus?

Não é contra o judeu, enquanto povo pertencente a uma certa raça, mas contra esse messianismo judaico que os católicos têm que combater. Jesus Cristo é o mesmo ontem, hoje e para todo o sempre, e para o mundo cristão já chegou o Esperado das Nações, que os Reis Magos adoraram no Presépio. Para os católicos, a salvação do povo de Israel está em sua conversão profetizada pelo Apóstolo das Gentes, e não nesse falso messianismo sionista.

Pedindo a Deus essa graça para o povo outrora escolhido, permaneçamos vigilantes para que o mundo ocidental não caia no cativeiro desse domínio sionista tão lamentavelmente vaticinado pelo sr. Osvaldo Chateaubriand.


| O BOOMERANG DO SR. VELASCO | (continuação da página 1)

[NR: houve truncamento no texto original na passagem de página].

Afirma o sr. Velasco ser socialista o Partido Trabalhista britânico, como todo mundo sabe, mas ao mesmo tempo tenta conciliá-lo com o catolicismo. Tratar-se-ia de um socialismo de tipo todo especial, que não hostilizaria nem a Deus nem aos princípios da civilização cristã.

Já houve quem o dissesse, sem que o sr. Velasco desse ao argumento resposta conveniente: — Será que as palavras tão claras de Pio XI na "Quadragesimo Anno" não são aplicáveis às ilhas britânicas ou onde quer que se confunda o socialismo com as reivindicações operarias?

O socialismo atenuado

Outro velho argumento do sr. Velasco diz respeito à "invencionice", segundo diz ele, de que "o socialismo democrático pretende abolir a propriedade privada e transferi-la para o Estado". Ora, bem sabem os católicos lúcidos que o socialismo ainda é condenado pela Igreja, mesmo quando esconde as unhas, como no caso de rejeitar a luta de classes e a supressão de propriedade privada . "Que dizer no caso em que o socialismo de tal maneira se modere e se emende no tocante à luta de classe e à propriedade privada, que não se lhe possa repreender nada nestes pontos? Por acaso com isso abdicou de sua natureza anticristã?" indaga Pio XI. E responde o Pontífice da Ação Católica: — "São muitos os católicos que, sabendo perfeitamente que nunca podem ser abandonados os princípios católicos nem ser suprimidos, parecem volver seus olhos a esta Santa Sé e pedir com instância que resolvamos se esse socialismo está suficientemente purgado de suas falsas doutrinas, para que sem sacrificar nenhum princípio cristão possa ser admitido e em certo modo batizado". Vem a seguir a palavra de ordem solene da Santa Igreja: — "Para satisfazer, segundo nossa paternal solicitude, a estes desejos, dizemos: — o socialismo, quer se considere como doutrina, quer como fato histórico, quer como "ação", se continua sendo verdadeiramente socialismo, mesmo depois de suas concessões à verdade e à justiça, de que fizemos menção, é incompatível com os dogmas da Igreja Católica, visto que sua maneira de conceber a sociedade se opõe diametralmente à verdade cristã" (Encíclica "Quadragesimo Anno").

Socialização, nacionalização, estatização

Diz o sr. Velasco que "socializar uma empresa não é dá-la ao Estado, mas entregá-la aos que nela trabalham". Mas quem vai entregá-la aos operários, não é o próprio Estado através de medidas legislativas? E como se pode conceber essa transferência sem violência ou injustiça, mesmo no caso de desapropriações e de indenizações ressalvados os casos sempre excepcionais, de utilidade pública, arbitradas por quem se acha armado por meio de leis e decretos, contra a vontade e por cima da cabeça dos legítimos proprietários?

A copropriedade e a cogestão das empresas não constituem um direito do trabalhador que deva ser imposto por medidas legais e coercitivas, como bem acentuou o Santo Padre Pio XII na alocução que proferiu a 3 de junho de 1950 perante os membros do Congresso Internacional de Estudos Sociais em Roma. Com isto, não se quer desconhecer a utilidade do que até aqui tem sido realizado no sentido do contrato de sociedade, de diversas maneiras, com vantagem comum de operários e de proprietários. Mas estamos em presença de medida facultativa de que as empresas privadas podem lançar mão de sua livre e espontânea vontade, e não de medida coercitiva, imposta como "estrutura de base", como quer o sr. Velasco. É contra o direito natural essa reforma de estrutura operada artificialmente por vias legislativas, sobretudo quando se tem em vista que "a economia — como qualquer outro ramo de atividade humana — não é de sua natureza uma instituição do Estado; pelo contrário, é o produto vivo da livre iniciativa dos indivíduos e de seus grupos livremente organizados" (Pio XII em alocução aos Delegados da União Internacional das Associações Pastorais Católicas, de 7 de maio de 1949).

Ignorância ou má fé

Há um ponto do arrazoado do sr. Velasco em que claramente transparece sua ignorância ou má fé. É quando declara que "a última vez que um Papa se referiu ao socialismo foi, há vinte anos, na Encíclica "Quadragesimo Anno". Ali, Sua Santidade Pio XI condenou o socialismo marxista, a doutrina materialista e não o programa econômico do socialismo que ele, ao contrário, julgou muito semelhante à doutrina social da Igreja. Depois desse pronunciamento, aquele Papa falou várias vezes, como dezenas de vezes tem falado o seu sucessor, o Papa Pio XII, sem mais aludirem ao socialismo, ao seu programa econômico ou às suas atividades políticas, porque a Igreja não vive na ignorância dos fatos que estão ocorrendo, em todo o mundo, inclusive na própria Itália, às portas do Vaticano".

Em primeiro lugar chega a ser ridículo dizer-se que desde a "Quadragesimo Anno" os Papas não mais se referiram ao socialismo. O próprio Pio XI, algumas semanas após a publicação daquela Encíclica, denunciava ao mundo, pela "Non Abbiamo Bisogno", a proteção dissimulada que o fascismo dispensava ao socialismo. E como se fosse necessário renovar sempre a condenação de um certo erro, para que tal condenação continue de pé. Mas apesar de estar bem condenado, pela "Quadragesimo Anno", não apenas o socialismo marxista e materialista, como quer o sr. Velasco, mas também o socialismo que apenas pretende ser mero sistema econômico, o Santo Padre Pio XII, gloriosamente reinante, tem reiterado essa condenação em mais de uma feita. Assim é que na Alocução de 11 de março de 1945, sobre o Sindicalismo Cristão, o Soberano Pontífice condena o fazer-se "daquilo que hoje se chama nacionalização ou socialização dos bens e democratização da economia, uma arma de combate e de luta contra o doador privado de trabalho enquanto tal". Como se vê, trata-se da condenação de uma medida puramente econômica, sem nenhuma referência a marxismo ou a materialismo.

Pio XII e a mentalidade socialista

Mais ainda. Em sua alocução de 3 de junho de 1950, atrás citada, o Santo Padre Pio XII, ao mostrar o perigo de que a classe operária caia por sua vez nos erros do capital, os quais consistem em subtrair, principalmente nas grandes empresas, a disposição dos meios de produção à responsabilidade pessoal do proprietário privado (individuo ou sociedade) para a colocar sob a responsabilidade de formas anônimas coletivas, acrescenta: "Uma mentalidade socialista acomodar-se-ia muito bem a semelhante situação. Mas esta não deixaria de causar real inquietação a quem sabe a importância fundamental do direito à propriedade privada para favorecer iniciativas e fixar responsabilidades em matéria de economia". E mostra o Santo Padre como igual perigo exige que os assalariados de uma empresa tenham direito de cogerência econômica", pois "nem a natureza do contrato do trabalho, nem a natureza da empresa, comportam necessariamente, por si mesmas, direito semelhante". E se não se trata de um direito, mas apenas de uma solução que pode oferecer vantagens em determinadas condições, como se justifica a tal mudança de estrutura, mediante entrega da empresa aos que nela trabalham, como faz parte do programa político do sr. Velasco? Nem se diga que tal socialismo "democrático" é legitimo, por se basear no sufrágio universal que guinda aos parlamentos as eventuais maiorias socialistas. O sufrágio popular não pode transformar um ato imoral em ato honesto e válido e não confere infalibilidade aos legisladores. A racionar-se desse modo, chegaríamos à conclusão de que foi honesto, válido e perfeito o gesto do povo judaico, escolhendo, por sufrágio direto, Barrabás a Cristo, indultando a um sedicioso, salteador e assassino e condenando o justo por excelência.

A Igreja não pede auxílio ao socialismo

Não se nega a necessidade de uma reforma em todos os setores da vida social hodierna, inclusive no que diz respeito à economia. Não se pode, porém, combater um erro com outro erro pior ainda. Eis por que disse Pio XI que Leão XIII "não pediu auxílio nem ao liberalismo nem ao socialismo; o primeiro se havia mostrado completamente impotente para dirimir legitimamente a questão social, e o segundo propõe um remédio que, sendo muito pior que o próprio mal, lançaria a sociedade humana em maiores perigos". (Enc. "Quadragésimo Anno").

O mal do socialismo é justamente considerar apenas o aspecto econômico, ou, como diz Pio XI, "pensam (os socialistas) que a abundância de bens que cada um há de receber nesse sistema para empregá-lo a seu prazer nas comodidades e necessidades da vida, facilmente compensa a diminuição da dignidade humana, à qual se chega no processo "socializado" da produção". E' preciso que o sr. Velasco se compenetre de uma verdade muito simples: além da miséria física, temos também de considerar a miséria moral. Em um campo de concentração pode haver comida farta, vestuário decente, diversões e o mais que se possa desejar quanto ao conforto material. Cerceada, porém, a liberdade, qual o verdadeiro filho de Deus que não sofrerá ali todos os horrores da miséria moral, do homem que vê sua dignidade menosprezada e amesquinhada?

A mentalidade socialista, criticada por Pio XII, é essa mesma mentalidade concentracionária, que quer transformar o mundo em um imenso campo de Dachau, tudo racionado, científico, sujeito a licença prévia, à padronização burocrática. Mundo em que a realidade social é substituída por um grande fichário e em que a volta do trabalho forçado será uma fatalidade inevitável.

Que o sr. Velasco desista de sua inglória e mesmo suspeita tarefa de iludir a boa fé e ingenuidade dos católicos pouco esclarecidos, capacitando-se do que tão claramente diz Pio XI quanto a ser o socialismo inconciliável com o verdadeiro cristianismo. E que esse socialismo democrático ou mitigado é até mais perigoso e apto para enganar aos incautos: "suave veneno, que sorvem avidamente muitos a quem jamais um socialismo declarado podia haver enganado." (Pio XI na Encíclica "Quadragésimo Anno").

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| LUÍS XVII: UMA QUESTÃO FASCINANTE | (continuação da página 1)

e a incertezas que deleitariam qualquer amador de modernas aventuras policiais.

Ao que parece, o assunto vai ser elucidado dentro de poucos meses. Com efeito, será aberto a 13 de Outubro próximo, no Quai d'Orsay, Ministério das Relações Exteriores da França, um pequeno cofre vermelho, lacrado com o sinete pontifício, que contém o testamento da Duquesa d'Angoulême, falecida em Praga a 13 de Outubro de 1851. Pouco antes de morrer, a Princesa ditou seu testamento ao Núncio Apostólico, Mons. Viale, confiando-lhe a guarda do precioso documento, sob a condição de que este só fosse aberto depois de cem anos. Quando da publicação do testamento na França, historiadores e políticos se voltarão, provavelmente, e com avidez, para os arquivos do Vaticano à procura de novos informes sobre o assunto nos relatórios do Núncio Viale.

Segundo revelações privadas de várias pessoas mortas em odor de santidade, ou canonizadas pela Igreja, como a Beata Taigi, parece que um descendente de Luís XVII teria um grande papel a representar em nossa época. A Igreja, porém, deixa aos fiéis liberdade de opinião sobre revelações desta natureza.

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| MONOPÓLIO ESTATAL... | (continuação da página 2)

um colégio em cada pequena cidade; e seis mil bolsas de estudos foram instituídas, para permitir às crianças pobres o acesso ao ensino secundário.

Finalmente, a 10 de maio de 1806, toda a obra educacional de Napoleão I foi coroada com a fundação da Universidade Imperial. Dirigida por um Grão Mestre e por um Conselho, de livre escolha do Imperador, compunha-se das Faculdades de Teologia, Direito, Medicina, Ciências e Letras. Dessas cinco, só as duas últimas eram novas, e destinavam-se mais particularmente à orientação do ensino em toda a França, devido ao entrosamento estabelecido entre elas e a Escola Normal Superior. Esta última, criada pela Convenção, tinha como finalidade, na concepção de Napoleão, fornecer todos os professores do País. Não teria cursos próprios, a não ser um ou outro de caráter pedagógico, e seus alunos seguiriam as aulas das Faculdades de Ciências ou de Letras. A verdadeira formação, no entanto, seria dada pela própria Escola. Daí adotar o regime de internato, para que mais facilmente adquirissem os futuros mestres a na parte [NR: pequeno truncamento de texto] chegou mesmo a pensar em um regime semelhante para todos os professores, obrigando-os ao celibato e à vida em comum, para preservar e desenvolver a formação que adquirissem nos bancos escolares.

Todo o ensino dependia da Universidade e não podia ser ministrado fora dela. A Universidade fornecia os professores, os programas, os métodos de ensino e até os horários para toda a França, de modo que, num momento dado, se poderia saber não só o que estava sendo ensinado por toda a parte, como a orientação e o método empregado nas lições.

O grande plano de Napoleão estava destarte, realizado: o Estado docente se substituía à Igreja docente.

Não foi esse, de resto, o único direito da Igreja espezinhado pelo Corso. Principalmente no fim do Império, a Santa Sé teve que lutar por todos os seus direitos. Deposto Bonaparte, esperava-se que a restauração dos Bourbons destruiria uma instituição tão nitidamente revolucionária como a Universidade. Tal, porém, não se deu. No início de seu reinado, Luís XVIII, começou a abatê-la, mas, depois dos Cem Dias, conservou tudo como estava, tentando aproveitar-se dela para os interesses de seu governo. O monopólio continuava e nem sequer foram tomadas medidas que impedissem a Universidade de continuar sua obra de expansão dos erros revolucionários.

A reação dos católicos não se fez esperar, mas logo foi abafada magistralmente com a nomeação do Bispo Mons. Frayssinous para Grão-Mestre, ficando em última análise sob sua dependência a orientação do ensino francês.

Cobrindo com sua autoridade episcopal todo o aspecto revolucionário da Universidade e, como um dos chefes do galicanismo, imprimindo-lhe uma detestável orientação religiosa, Mons. Frayssinous, sem nada corrigir, acrescentava mais uma nota anticatólica à máquina de Napoleão. Aliás, a influência religiosa era absolutamente sem significado na Universidade. Basta lembrar, como exemplos, que os professores dos liceus recomendavam a seus alunos que fizessem a Páscoa, embora não tendo fé, para agradar os poderosos do momento, e que num dos Liceus de Paris a tese da existência de Deus era posta em votação. Um padre enviado por Mons. Frayssinous em inspeção pela França, voltou de tal forma horrorizado que morreu de desgosto. Apesar de tudo, negando a evidência, e não dando ouvido às informações e relatórios que recebia, Mons. Frayssinous declarava que o ensino francês ia muito bem do ponto de vista católico.

Em 1830 cai Carlos X, que sucedera a Luís XVIII. Para subir ao trono, Luís Filipe foi obrigado a jurar uma Carta, na qual era expressamente declarado que haveria na França a liberdade de ensino.

A Universidade, contudo, foi conservada, felizmente não mais nas mãos de Mons. Frayssinous. A promessa de Luís Filipe de promulgar uma legislação que abolisse o monopólio estatal, não era executada.

Embora o ideal fosse o fechamento da Universidade, o mínimo que os católicos deveriam exigir, uma vez que o Estado não queria se privar desse instrumento de formação da opinião pública, era a liberdade para a Igreja de também formar o seu ensino, tanto mais que essa possibilidade era uma promessa explícita do Rei. É para obter esse mínimo, vital para qualquer católico, que Montalembert vai organizar o Partido Católico e escrever a mais bela página de sua vida, como veremos nos artigos seguintes.

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