A PERSONALIDADE E A OBRA DE UM GRANDE BISPO

A influência e a ação de D. Antonio de Castro Mayer no Brasil e no exterior – Um bispo que Campos conhece e admira: D. Geraldo de Proença Sigaud

No dia 23 do corrente, transcorrerá o terceiro aniversário da sagração episcopal do Exmo. Revmo. Sr. Bispo Diocesano, Dom Antonio de Castro Mayer, promovido em 1949 pelo Santo Padre Pio XII, gloriosamente reinante, do cargo de Cônego Catedrático do Cabido Metropolitano de São Paulo, e Vigário Ecônomo de São José do Belém, para a dignidade de Bispo Titular de Priene e Coadjutor do pranteado Arcebispo-bispo de Campos, Dom Otaviano Pereira de Albuquerque.

Quando a comunicação da nomeação de S. Excia. Revma. chegou a Campos, propalou-se célere a notícia de que a Santa Sé escolhera, para amparar a veneranda ancianidade de nosso Arcebispo-Bispo, um Sacerdote que adquirira em todo o Brasil reputação do teólogo de alto valor, e um homem de ação que se assinalara na Vigararia Geral de São Paulo, e na direção da populosa Paróquia de São José do Belém. Assim, quando da chegada de S. Excia. Revma. a esta cidade, cercava-o lisonjeira e carinhosa expectativa.

Mas — podemos dizê-lo com o devido respeito? — era sempre uma expectativa. Embora fossem notórias as qualidades do novo Prelado, ansiávamos todos por um conhecimento mais direto de sua personalidade, afim de sentir de perto a irradiação de seu zelo e ouvir a pulsação apostólica de seu coração sacerdotal. Manda a verdade que declaremos que, decorrido pouco tempo, nossa expectativa tinha todos os motivos para estar satisfeita.

Enquanto foi vivo Dom Otaviano Pereira do Albuquerque, toda a cidade pôde notar o tacto, a nobre discreção, o filial carinho com que se conduziu, na delicada situação de Coadjutor, o Exmo. Revmo. Sr. Dom Antonio de Castro Mayer. Ascendendo ao governo da Diocese pelo falecimento do ínclito Arcebispo-Bispo, o antigo Coadjutor começou a revelar em toda a plenitude as suas altas qualidades para pastoreio das almas. A função da Igreja consiste em ensinar, governar e santificar. É o que vem fazendo entre nós o ilustre Prelado, com incontestável êxito e brilho.

Teólogo consumado, o Exmo. Revmo. Sr. D. Antonio de Castro Mayer se tem revelado ao mesmo tempo observador arguto da vida espiritual e material de seus Diocesanos. Daí não ser sua doutrinação apenas um ensinamento puramente teórico e esquemático, sem relação com a realidade da vida quotidiana. Pelo contrário, ele apresenta sempre a doutrina enriquecida de aplicações práticas da mais flagrante atualidade; dir-se-ia um sociólogo com alma de teólogo. Neste sentido é de se registrar a repercussão profunda que seus discursos têm tido em nossos círculos intelectuais, onde S. Excia. Revma. é reconhecido como figura exponencial.

Como homem de governo, o Exmo. Revmo. Sr. Bispo Diocesano se tem assinalado por sua operosidade e firmeza.

Afim de manter contato assíduo com o Clero, a quem tão particularmente ama, o novo Prelado inaugurou as reuniões bimensais dos Vigários da Diocese. Fundou ele, em comemoração do primeiro aniversário da Constituição «Bis Saeculari», a Federação das Congregações Marianas, e deu início aos retiros que os valorosos congregados de Campos realizam durante o Carnaval. A Federação Mariana Feminina recebeu dele vigoroso impulso, de que é expressão significativa o boletim dessa entidade, «Salve Maria». Também o ensino catequético se beneficiou de sua operosidade. S. Excia. Revma. tomou pessoalmente a si o curso de formação de catequistas. Ao mesmo tempo deu início às manhãs de recolhimento para estas, e reorganizou todo o ensino de catecismo.

Muito afeiçoado ao estado religioso, que não cessa de elogiar e preconizar, deseja naturalmente o Exmo. Revmo. Sr. D. Antonio de Castro Mayer atrair famílias religiosas para a Diocese. Nossa cidade já conta, graças o seu zelo, com a presença das Irmãs de Jesus Eucarístico na S. Casa de Misericórdia, e com a das valorosas Irmãs carmelitas no hospital de Pádua. É de capital importância notar a vinda a Campos dos beneméritos missionários do Coração de Jesus, o que proporcionou, entre outras vantagens, a possibilidade de prover cinco paróquias vagas.

Outrossim, já tem S. Excia. adiantadas as providências para formar um novo Colégio para meninas em Campos, bem como o Seminário Menor em vasta área de 48.400 metros quadrados em perímetro urbano, doação do Sr. Julião Nogueira, proprietário da grande usina «Queimado».

Por fim, em sua missão de santificar, vem o eminente Prelado realizando extensas e árduas visitas pastorais, por toda a vastidão da Diocese, com uma dedicação e bondade que lhe tem cativado a estima geral. Já percorreu S. Excia. quase todo o território Diocesano, que tem, como sabemos, aproximadamente um terço da superfície do Estado do Rio.

Testemunhando seu apreço pela obra realizada pelo ilustre Prelado, a população campista lhe ofereceu um excelente automóvel Studebaker último tipo, facilitando-lhe as viagens em território tão extenso, e atendendo ao mesmo tempo às conveniências do decoro episcopal.

Ao par destas atividades em prol dos interesses espirituais da Diocese, vem S. Excia. Revma. desenvolvendo uma atuação profunda no plano geral dos mais altos problemas da vida religiosa do Brasil. Assim, tem participado com inconfundível relevo, no estudo dos múltiplos assuntos referentes à Ação Católica que vêm empolgando a opinião católica nestes últimos anos, a ponto de ser hoje uma das figuras mais ilustres do Episcopado Nacional. Sua reputação, aliás, já transpôs as próprias fronteiras do País. Seus trabalhos — artigos, discursos, conferencias — têm sido acolhidos com interesse nos mais altos círculos católicos da Europa, e particularmente seus comentários sobre a «Bis Saeculari» tiveram repercussão verdadeiramente mundial. Assim se explicam as manifestações de excepcional consideração com que o ilustre Prelado foi recebido nos círculos católicos dos vários países em que esteve durante sua recente viagem a Europa.

Se procurarmos definir as qualidades que granjearam para o egrégio Prelado desta Diocese tão excepcional situação, devemos considerar aquilo que é verdadeiramente o ponto central de sua personalidade: a devoção ao Papa. Quem dissesse que Dom Antonio ide Castro Mayer é sobretudo uma alma que vive para o Papa, não estaria inteiramente com a verdade. Ele vive, não só principalmente, mas exclusivamente e inteiramente para o Papa. E este amor ao Papado transparece em todos os seus atos, desde os menores aos mais graves. Seus íntimos sabem, por exemplo, que nas horas de lazer nenhum passatempo mais o recreia do que ler, em qualquer bom autor, algum episódio interessante da História dos Papas. Nas palestras mais comuns da vida quotidiana, é frequente vê-lo dirimir algum assunto controvertido, citando um documento pontifício. No extremo oposto, não há solução que lhe pareça satisfatória para os mais árduos e difíceis problemas do governo diocesano sem que esteja em íntima e exata consonância, não só com as diretrizes e o espírito, mas com as tendências da Santa Sé no assunto. De um temperamento afetivo, de um trato simples e amável, disposto a ceder sempre e a tudo conciliar principalmente quando a conciliação não importa em inconveniente senão para ele, Dom Antonio de Castro Mayer é capaz das intransigências mais irredutíveis, das deliberações mais intrépidas, das atitudes mais desassombradas, se está em jogo, direta ou indiretamente, a honra, a autoridade, a vontade do Soberano Pontífice. É ao serviço deste ponto central que está, por assim dizer, constantemente mobilizada toda a sua personalidade. Sua inteligência pronta, cintilante, penetrante, seu senso de observação subtil e incansável, parecem estar num exercício permanente para encontrar em tudo — no bem como no mal — elementos para explicar, fundamentar ou aplicar as diretrizes pontifícias. Assim, é frequente ver como ele sabe apontar, na raiz de algum êxito alcançado pelos católicos, a observância desta ou daquela diretriz da Santa Sé; ou na origem de qualquer revés a inadvertência em seguir à risca o que ordenou o Sucessor de São Pedro. Se somarmos à devoção ao Papa um espírito ardente e profundamente mariano, uma viva devoção eucarística, teremos descrito os ideais para os quais palpita a todo o instante o coração todo penetrado de espírito sobrenatural, de nosso ínclito Bispo Diocesano.

Este o aspecto positivo de sua personalidade. Mas há também um aspecto por assim dizer negativo. Fora disto, fora da causa da Santa Igreja, fora do âmbito do cumprimento de seu dever de Bispo — entendido aliás no mais amplo sentido da palavra, isto é, abrangendo tanto a esfera estritamente espiritual quanto o riquíssimo terreno em que o espiritual e o temporal se interpenetram — para S. Excia. Revma. nada tem importância: conforto, tranquilidade, renome, personalismos, pequenos pontos de amor próprio. É o que explica a admiração e o carinho que ele suscita em torno de si. Verdadeiro homem de Deus, sabe ser um leão para defender a Igreja, e um cordeiro para sacrificar a todo o instante suas vantagens pessoais, modesto a tal ponto que «CATOLICISMO» é obrigado a fazer uma pública confissão: transgredimos uma ordem formal de S. Excia. Revma., publicando hoje sua fotografia, e julgamos muito provável que esta afetuosa expansão de admiração e carinho lhe pareça excessiva e desagradável. Conforta-nos entretanto que em toda a Diocese e em todo o Brasil só S. Excia. pensará assim...

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Estamos certos, pelo contrário, de agradar vivamente a S. Excia. — e seja esta a reparação por nossa desobediência — associando a seu nome, neste número, o de um amigo que, se não á irmão pelos laços do sangue, o é muito mais real e profundamente, não só por uma íntima participação nos mesmos ideais de doutrina e de ação, como ainda no Episcopado: Dom Geraldo de Proença Sigaud, S.V.D., Bispo Diocesano de Jacarezinho. Com efeito, no mesmo mês de Maio, por feliz coincidência, se celebrará o aniversário da sagração episcopal do ínclito Bispo de Jacarezinho, a qual se realizou a 19 deste mês.

Campos já teve, por duas vezes, a honra de receber a visita de S. Excia. Revma., e conhece sua eloquência e seu talento, evidenciados na magnífica oração gratulatória com que saudou, em nossa Catedral, a posse do então Bispo Coadjutor.

A Igreja tem sido por vezes acusada, por espíritos superficiais, de destruir todas as personalidades, fundindo-as no mesmo molde. Quem conheça de perto os dois ilustres Prelados jamais poderá pensar assim, pois que são ao mesmo tempo as pessoas mais semelhantes e mais dissemelhantes que se possa imaginar. E, neste sentido, pode-se dizer que a imensa dissemelhança física de ambos bem espelha a sua completa diferença de temperamento e de feitio pessoal, diferença tão completa que um paralelo entre eles se tornaria quase impossível. Contudo, não há uma palavra do que dissemos sobre o amor ao Papado, a devoção mariana, o espírito eucarístico de Dom Antonio do Castro Mayer, que não se aplique ponto por ponto ao Exmo. Revmo. Sr. Dom Geraldo de Proença Sigaud.

Como Dom Antonio de Castro Mayer, Dom Geraldo de Proença Sigaud é teólogo insigne, acatado por sua inteligência excepcional e grande cultura, em todo o país e no exterior, onde seus trabalhos e publicações têm alcançado funda repercussão. As relações entre ambos os Prelados datam da época em que, juntos, trabalharam na Ação Católica da Arquidiocese paulopolitana. Empenhados nas mesmas lutas, irmanados nos mesmos triunfos, mais tarde nas mesmas provações, e por fim nas mesmas honras do Episcopado, continuam a trabalhar com um só espírito e um só coração em prol da Santa Igreja no Brasil. A Diocese de Jacarezinho é das mais vastas e difíceis de todo o Brasil, pois que constitui o ponto de atração e de fixação constante, não só de emigrantes procedentes de todos os pontos do território nacional, mas ainda do exterior. Japoneses, nordestinos, alemães, paulistas, italianos, mineiros, gaúchos, eslavos ali ombreiam a cada momento, produzindo um ambiente eclético e pitoresco, no qual se espelham as mais variadas tradições, aspirações, tendências e costumes. Por uma circunstância muito feliz, a imensa maioria dos elementos novos é católica. Será talvez o que explique que o Norte do. Paraná se desenvolve num ambiente de trabalho fecundo, porém sem as tropelias e desordens características das zonas novas. Cumpre porém manter e estimular as tendências religiosas da população, e fazer marchar o progresso espiritual ao ritmo das atividades civis e econômicas.

Neste sentido, o Exmo. Revmo. Sr. Dom Geraldo de Proença Sigaud que recebeu na Congregação do Verbo Divino uma formação de missionário autêntico — tem desenvolvido em sua Diocese um trabalho que, sem favor nenhum, deve ser qualificado de titânico. Erguendo igrejas - Catedral de Jacarezinho será das mais belas do Brasil organizando obras, articulando movimentos, mantendo contato não só com os fazendeiros como com os colonos, não só com centros importantíssimos como Jacarezinho ou Londrina, mas com lugares dos mais obscuros e atrasados, S. Excia. Revma. se tem sabido impor ao mesmo tempo à admiração das classes altas por sua cultura extraordinária, sua inteligência brilhante, seu trato fidalgo, como à gratidão das camadas populares por sua bondade, sua afabilidade, sua compreensão excepcional da alma e dos anelos do homem do campo.

No momento, S. Excia. Revma. Se encontra em Roma, junto aquele trono de São Pedro que é o centro de atração de todas as fibras de seu grande coração de Bispo. Assim, não terão seus diocesanos oportunidade de lhe expressar diretamente suas felicitações, que reservam para as grandes manifestações que assinalarão a sua chegada.


O SANTO PADRE ABENÇOA A DIOCESE

Por motivo da festa de Páscoa, o Exmo. Rev. Sr. Dom Antonio de Castro Mayer, Bispo Diocesano, telegrafou a Sua Santidade o Papa Pio XII, gloriosamente reinante, apresentando respeitosamente ao Vigário de Cristo, em seu nome e de toda a Diocese votos de felicidade.

Em resposta, recebeu S. Excia. Revma. o seguinte telegrama:

«O Augusto Pontífice, ao receber as felicitações de Páscoa, invoca para ti e teu rebanho as alegrias de Cristo ressuscitado, e abençoa de todo coração.

(a) Montini, substituto».