MONSENHOR SLOSKANS,

BISPO E MÁRTIR

Recebeu a Sagração Episcopal em Plena Rússia Soviética

A atenção e a piedade dos fiéis estão voltadas nos últimos anos para os heroicos paladinos da Fé, que, como Mons. Stepinack, na Iugoslávia, Mons. Beran na Tchecoslováquia, e principalmente, na Hungria, o grande Cardeal Mindszenty, sofrem perseguições por amor à Justiça.

A imprensa mundial não deu tanto relevo à figura de outro Bispo Mártir de nossos dias, Mons. Boleslau Sloskans, Administrador Apostólico de Minsk e Mohilef, cujo nome, entretanto, será lembrado com veneração por quantos escreverem a História da Igreja no século XX.

Mons. Boleslau Sloskans nasceu em 1894, em Latgola, pequena aldeia situada na região católica da Letônia chamada Ludza. Seus estudos sacerdotais foram feitos no Seminário de S. Petersburgo, então Capital do Império Russo, ulteriormente denominada "Leningrado" pelos comunistas. Ordenado Sacerdote nas vésperas da Revolução bolchevista de 1917, começou ele a exercer o ministério em uma pequena paróquia russa.

Sagração episcopal clandestina

Com o advento do regime comunista, a perseguição religiosa começou imediatamente a se fazer sentir, atingindo em pouco tempo tais extremos que todas as atividades da Igreja tiveram de se exercer na mais estrita clandestinidade. Como é fácil imaginar, a Hierarquia católica, dizimada pelo tempo e sobretudo pelas perseguições, se foi tornando sempre menos numerosa na Rússia, e a situação se tornou tal que a Santa Sé teve motivos para recear que, por falta de Bispos, a vida religiosa acabasse por desaparecer naquele desditoso país. Em 1926, o Papa Pio XI deliberou, pois, nomear um novo Bispo para a Rússia. Não havendo possibilidade de fazê-lo sagrar por outro Bispo de sua própria terra, e vedando evidentemente as autoridades soviéticas o ingresso de qualquer prelado católico na URSS, a Santa Sé se viu na contingência de usar um meio extraordinário. Assim, foi às ocultas sagrado Bispo em Roma um Sacerdote da Companhia de Jesus a quem o Santo Padre conferiu a difícil missão de entrar disfarçado na Rússia, e ali, às ocultas também, conferir o episcopado a um sacerdote russo. Mantinha-se por esta forma a existência de uma Hierarquia na Rússia, sendo o novo Bispo nomeado Administrador Apostólico de Minsk e Mohilef. O Sacerdote russo escolhido para receber em circunstâncias tão dramáticas as honras do Episcopado foi o Pe. Boleslau Sloskans, que contava então 32 anos de idade.

Bispo e prisioneiro

Não recebeu o novo Prelado, por ocasião de sua sagração, a cruz peitoral, nem poderia usá-la. Mas, logo a seguir, recebeu a cruz do sofrimento e da prisão. Com efeito, o fato da sagração de Mons. Sloskans chegou ao conhecimento da polícia soviética, o que valeu a este uma condenação sumária à reclusão na penitenciária de Solovki, situada em uma ilha gélida do Mar Branco.

A condenação era de três anos. Decorridos estes, Mons. Sloskans regressou a Mohilev, afim de retomar suas funções. Mas, dez dias depois, foi novamente preso e deportado para a Sibéria, onde esteve sucessivamente em vinte e oito campos de trabalhos forçados.

A libertação

Os letões, impressionados com o heroísmo do egrégio Bispo seu conterrâneo, desejavam ardentemente libertá-lo. Para isto se apresentou uma ocasião quando, em 1933, o governo da Letônia prendeu em Riga um perigoso agente comunista. Mostrando-se a polícia política da Rússia muito interessada em libertar este valioso cooperador, o governo letão estabeleceu como condição que os bolchevistas pusessem em liberdade Mons. Sloskans. Os russos anuíram. A ordem de libertação de Mons. Sloskans o foi alcançar no presídio de Staro-Turchanska. Em seguida, sob a proteção das autoridades soviéticas, foi o Prelado encaminhado à fronteira de sua Pátria.

Por esta forma, tudo se modificava na vida de Mons. Sloskans. De infeliz prisioneiro, sujeito às condições de existência mais miseráveis, e exposto a perder a vida de um momento para outro, passava a ser novamente um homem livre, reintegrado na vida de sua Pátria, e, mais ainda, cercado de toda a reverência a que lhe davam direito não só a dignidade episcopal como a fama de seu heroísmo. Tal era o realce que adquirira na Letônia o eminente Prelado, que o próprio Presidente da República o foi esperar na fronteira soviética, em 20 de Janeiro de 1933, data em que finalmente foi permutado pelo espião russo. Quando Mons. Sloskans foi entregue pelos comunistas, vestia o traje de condenado a trabalhos forçados, e trazia um saco às costas. A cena exprimia nitidamente o contraste flagrante entre a situação dramática de que o Prelado saía, e a situação brilhante que o esperava. Se qualquer pessoa se imaginasse em seu lugar, poderia avaliar facilmente a alegria e a sofreguidão com que Mons. Sloskans caminhava para a sua nova existência.

Inquebrantável fidelidade ao Papa

Mas foi precisamente o contrário que se deu. Senhor de si, equânime no infortúnio como na vitória, Mons. Sloskans deu toda a medida de sua têmpera sobrenaturalmente inflexível, dirigindo-se ao Presidente da República com estas palavras: "O Santo Padre consente na minha libertação? Porque se a troca foi efetuada sem o seu consentimento, estou disposto a retomar o caminho das minhas prisões, pois meu dever é ficar ali".

Depois de longo tratamento médico, S. Excia. Revma. se dirigiu, em 1934, a Roma, afim de prestar homenagem ao Vigário de Cristo. O Santo Padre Pio XI o recebeu em audiência, porém não consentiu que Mons. Sloskans se ajoelhasse em sua presença, e, descendo do trono, o abraçou afetuosamente. A audiência durou duas horas e meia. O acolhimento afetuoso do Papa recompensava de sobejo Mons. Sloskans de todos os sofrimentos passados.

Durante uma sessão realizada em homenagem de Mons. Sloskans no Colégio Russo de Roma, o então Cardeal Pacelli, hoje Papa gloriosamente reinante, o presenteou com a cruz peitoral do Cardeal Merry del Val, o grande Secretário de Estado e braço direito do Beato Pio X.

Novas provações

A Providência, porém, reservava Mons. Sloskans para novas provações. Desta vez, vieram elas novamente dos comunistas, e, também, dos nazistas, inimigos dos comunistas na aparência, porém na realidade, tão coletivistas e tão anticatólicos como estes.

Com efeito, em 1939, depois de alguns anos de vida tranquila, em que Mons. Sloskans se dedicou inteiramente à formação dos futuros Sacerdotes na Pontifícia Faculdade de Teologia de Riga, os comunistas invadiram a Letônia, e começaram imediatamente a perseguir a Igreja. Em 1941, foram eles rechaçados pelos nazistas, que encarceraram Mons. Sloskans juntamente com dois outros Bispos e cerca de vinte Sacerdotes, e os deportaram para a Alemanha.

Formador de futuros mártires

Foi ali que as tropas aliadas os encontraram, dando-lhes logo a liberdade. Mons. Sloskans, então, se dirigiu para a Bélgica, onde está atualmente encarregado da formação dos seminaristas letônios exilados.

A Letônia está atualmente ocupada pelos russos, e estes jovens seminaristas se preparam para exercer em sua desditosa Pátria um apostolado análogo àquele em que se ilustrou o grande Bispo ao qual a Igreja confiou a formação de suas almas.

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ATUALIDADE DO ESPÍRITO MARIAL CARMELITANO

Julia Freitas Guimarães Ablas

Em preparação ao Congresso Carmelitano, realizado em Recife no mês de julho último, a imagem de Nossa Senhora do Carmo percorreu diversas cidades dos diferentes Estados do país, onde lhe foram prestadas as mais entusiásticas homenagens. O Congresso foi uma das mais imponentes manifestações marianas dos últimos tempos.

Ocorrendo este ano, que é para todo o mundo um Ano Santo, o VII Centenário do escapulário do Carmo, pelas próprias mãos de Maria a S. Simão Stock, é muito louvável que se realizem festejos como esses revestidos de um brilho e um esplendor especialíssimos, porquanto visam lembrar que a dádiva do escapulário aos homens contém a promessa dessa Virgem Fiel de lhes alcançar o privilégio da morte em estado de graça — e portanto de lhes assegurar a salvação eterna — se eles o usarem piedosamente durante a vida.

Seria inadmissível, porém, que aqueles que possuem a felicidade de ser filhos dileto da Virgem do Carmelo — os Irmãos da Ordem III, — se limitassem a celebrar o faustosíssimo centenário com o envergar os próprios hábitos e comparecer as solenidades de um modo que pudesse assemelhar-se, ainda que de longe, a um frio formalismo. Muito pelo contrário: — juntamente com seus hábitos, deverão eles revestir-se de um espírito de devoção mais fervorosa e de obediência mais completa os desejos dessa Mãe incomparável, — desejos que vêm expressos na nova Regra da Ordem III de Nossa Senhora do Monte Carmelo, recentemente aprovada por S. Santidade o Papa Pio XII, gloriosamente reinante.

Sabemos que se conhece o bom católico pelo amor que dedica ao Vigário de Cristo na terra, pela diligência que emprega em conhecer-lhe as diretrizes, pela docilidade, principalmente, com que as segue como seguiria ao próprio Cristo. É dever do irmão terceiro, portanto, conhecer a nova Regra que o Sumo Pontífice propôs à sua Ordem, e sobretudo procurar seguir-lhe as determinações sapientíssimas, — o que se consegue com a ajuda daquela que é o «Auxilio dos Cristãos».

Ora, à simples leitura desse precioso documento, verificamos que, aprovando a nova Regra promulgada pelo Revmo. Padre Geral, Frei Kiliano Lynch, ensina o Sumo Pontífice ser a perfeição cristã — fim primordial da Ordem III, — perfeitamente acessível aos fiéis que vivem no mundo, o que aliás fora afirmado pelo próprio Jesus Cristo: «Sede perfeitos, como vosso Pai celeste é perfeito». E não se diga que os meios atuais de perfeição deverão ser inteiramente diversos dos meios tradicionais da ascese cristã, porquanto vivemos num século de movimento, de conforto material e de progresso: Leia-se a nova Regra, e nela se encontrarão recomendados — o silêncio, «fomentador excelente da oração», a abnegação de si mesmo, a união intima com Deus pela oração e pela devoção a Nossa Senhora. A fuga das conversas inúteis, dos bailes, espetáculos, etc., que mais agradam ao espírito do mundo do que a Deus. A abstenção de livros, jornais, revistas, etc., e de programas radiofônicos que possam ser prejudiciais. A castidade conforme o próprio estado; a caridade fraterna. O uso do santo escapulário, a recitação diária do terço. A comunhão semanal e até mesmo cotidiana, segundo conselho do Diretor espiritual, não só corresponderá melhor ao desejo da Igreja, mas também ao espírito da Ordem Carmelitana. A renovação frequente da Profissão, feita por devoção, em particular, ou enquanto possível em comum na presença do Diretor, preferivelmente em datas determinadas pela Regra, para se lucrarem as indulgências anexas a este piedoso exercício. E ainda: «A exemplo de nosso Santo Pai Elias e outros Santos da Ordem aproveitem os irmãos a vida em propagar o reino de Deus e em socorrer o próximo, prestando serviço à Ação Católica sob conselho e direção dos Superiores.»

O espírito é, pois, contrário ao espírito do mundo, desse mundo pelo qual nem o próprio Salvador quis pedir ao Pai: «Não vos rogo pelo mundo»... (Jo XVII, 9). E isso compreende-se facilmente, pois o príncipe deste mundo é Satanás, enquanto que é Maria a Rainha do Carmelo...

Desde a queda original ficou o homem sujeito às mesmas misérias sendo consequentemente idênticas as lutas que terá, de sustentar através de todos os tempos. E se Deus decretou pôr inimizades entre a descendência de Satanás e a de Maria, parece ela ser mais irreconciliável do que nunca neste século em que, no dizer de Pio XII, a humanidade perdeu até mesmo «o senso do pecado».

«Ipsa conteret caput tuum!» — Ela mesma te esmagará a cabeça! A luta, entre os filhos da serpente e os de Maria torna-se cada vez mais acirrada com o correr dos tempos. O anjo das trevas arma terríveis ciladas ao calcanhar da Virgem, isto é, aos seus humildes filhos. Mas, estamos, segundo o afirma o Soberano Pontífice, no século do Maria, sob cujos auspício e inspiração se desenvolve o mais eficaz apostolado leigo, porquanto tendo sido Maria quem venceu o inimigo infernal, será também Maria quem o há de vencer até o fim dos séculos, em defesa da Igreja Católica, realizando admiravelmente a promessa do Divino Mestre: — «As portas do Inferno não prevalecerão contra ela»... «Adveniat regnum Mariae!»

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AS FAMÍLIAS RELIGIOSAS (conclusão)

A ORDEM DOS CARTUXOS, NUNCA REFORMADA PORQUE NUNCA DEFORMADA

Ordens Monásticas. São as que seguem a tradição do monaquismo primitivo e vivem em mosteiros autônomos.

Desde os inícios do cristianismo os conselhos e exemplos do Divino Mestre encontraram generosos seguidores, que vieram constituir as legiões de virgens, apontadas por Santo Atanásio como "grande sinal da religião que está entre nós", e de ascetas, eremitas e anacoretas, que passaram a vida em penitência, recolhimento e oração. O mais célebre de todos os ascetas dos primeiros tempos é São Paulo Eremita, que, com a idade de 16 anos retirou-se para o deserto, onde morreu, em 341, após 97 anos de penitência.

Com base na vida ascética, já amplamente praticada no século III, surgiram no século IV, as comunidades de anacoretas.

Os que se aplicavam aos exercícios de perfeição cristã em comum começaram a ser conhecidos por monges, embora a palavra monachus, da raiz grega monos, designe o que vive só. O lugar por eles habitado foi chamado monasterium, lugar onde se vive só, que deu mosteiro. Com isso indicava-se a condição necessária para ser monge — a solidão.

O iniciador da vida monástica foi Santo Antão, discípulo de São Paulo Eremita. Viveu inicialmente como eremita e depois reuniu em torno de si uma inumerável multidão de discípulos, que viviam solitários, mas se reuniam para ouvi-1o. As comunidades antonianas, sempre constituídas de um mestre e de seguidores, espalharam-se logo pelo Egito e toda a Palestina.

O legislador desses monges, que tinham vida em comum e que por isso eram chamados cenobitas, foi São Pacômio. Em 327 fundou no Egito a primeira comunidade de religiosos com regras próprias. Organizou também mosteiros femininos. Cada mosteiro era governado por um abade, ou Arquimandrita, que quer dizer cabeça de grei, e todos estavam subordinados a um Abade Geral. Essa forma de vida se difundiu rapidamente pela Ásia Menor, chegando até a Pérsia.

São Basílio foi o reformador da vida monacal na Ásia Menor, tendo escrito duas regras que servem de base a várias Ordens modernas de origem basiliana.

Do oriente as comunidades de monges se propagaram para o Ocidente, principalmente por obra de Santo Atanásio, Santo Ambrósio e Santo Agostinho.

Na Europa se estenderam com grande rapidez, mas entraram em decadência no século V, justamente quando a Igreja mais necessitava de homens santos para converter os bárbaros, vencedores do Império romano.

Nesses tempos calamitosos a Providência enviou um homem que deveria renovar o monaquismo e possibilitar, com a florescência da santidade, uma época de grande esplendor para a Igreja. Foi São Bento de Núrsia. Fundou o grande mosteiro de Monte Cassino, que serviu de modelo a muitos outros, e escreveu em 530 a Regula Monasteriorum, cujo princípio fundamental é a conversão do monge a Deus pela oração e pelo trabalho, a fim de torná-lo apto a toda boa obra.

Os discípulos de São Bento, enviados pelo Papa a evangelizar os pagãos, conquistaram para Cristo novas terras. São famosos São Plácido, o apóstolo da Sicília; Santo Agostinho, da Inglaterra; São Bonifácio, da Alemanha.

No começo do século X, devido ao relaxamento que aos poucos se alastrara, a regra de S. Bento quase fora esquecida. Para restituir aos mosteiros a fisionomia de santidade, com a oração e o trabalho, foi fundada a célebre comunidade de Cluny. Aos 11 de Setembro de 910, Guilherme, duque de Aquitânia e conde de Alvérnia, dava e consagrava aos Santos Apóstolos Pedro e Paulo as propriedades que possuía em Cluny, para que em honra dos mesmos Santos se erigisse um mosteiro e aí se reunissem monges de São Bento, cuja direção confiou a S. Bernon, conde de Borgonha. Sucederam a S. Bernon abades de grande santidade, como Santo Odon e Santo Odilon, e assim a abadia de Cluny tomou posição de relevo perante todas as outras, que, filiando-se a ela, adotavam a sua reforma. Iniciou-se dessa maneira um glorioso período de dois séculos para a vida monástica.

Seguiram-se novas épocas de relaxamento e novas reformas, das quais se originaram as ordens monacais existentes em nossos dias.

Constituem atualmente ordens monásticas, no rito latino, os Beneditinos, divididos em negros (compreendendo 14 famílias diversas) e brancos (compreendendo as Camaldulenses, Cistercienses, Olivetanos, Mequitaristas, etc.); os Cartuchos, e no rito oriental os Paulinos, Antonianos e Basilianos.

Ordens Mendicantes. Caracterizam-se pelas seguintes particularidades: 1.° — Pobreza corporativa. Além da pobreza individual os mendicantes professam a pobreza da própria Ordem. Esse caráter, que no início obrigava os Religiosos a viver exclusivamente de esmolas, foi aos poucos atenuado pelos Sumos Pontífices, permitindo-lhes possuir bens em comum. Apenas aos Frades Menores e os Capuchinhos está atualmente interdita a propriedade em comum. 2.° — Vida regular unida ao ministério sacerdotal, apostólico, missionário e caritativo. 3.° — Centralização do regime. Cada Ordem tem um Superior Geral, com plenos poderes, ao qual estão subordinadas as Províncias, que são o conjunto de vários conventos.

Geralmente essas Ordens são constituídas de uma Ordem Primeira, para homens; uma Ordem Segunda, para mulheres, e, enfim, uma Ordem Terceira, para Leigos, esta sem voto público e sem obrigação de viver em comunidade, mas com promessa de tender à perfeição.

Nasceram nos inícios do século XIII, sob o pontificado de Inocêncio III, num tempo em que era sensível a decadência das ordens monásticas. Sob o impulso da santidade de São Domingos de Gusmão e São Francisco de Assis tiveram rápido desenvolvimento e exerceram grande influência na renovação dos costumes.

Contam-se hoje entre os Mendicantes os Dominicanos, Franciscanos, Agostinianos, Carmelitas, Trinitários, Mercedários, Servitas e Mínimos.

Ordens de Clérigos Regulares. Têm por finalidade própria o ministério apostólico. Surgiram no século XVI e foram baluartes da Igreja no esforço desenvolvido para preservar a Cristandade do movimento da pseudo-Reforma. Papel saliente cabe então à milícia fundada por Santo Inácio de Loyola, a Companhia de Jesus. Além dos Jesuítas são também Clérigos Regulares os Teatinos, os Barnabitas e outros.

Ordens Contemplativas e Ordens Ativas

Além da finalidade geral das Ordens Religiosas, que é, como dissemos, a de levar seus membros à perfeição cristã, têm elas fins particulares.

Sob esse aspecto dividem-se em duas grandes categorias:

1.° Ordens que se consagram à vida puramente contemplativa; 2.° Ordens que se dedicam à vida ativa.

Entre os Religiosos de vida contemplativa merecem referência especial os Trapistas, Camaldulenses, Cistercienses e Cartuxos, e entre as Religiosas as Carmelitas, Clarissas, Beneditinas e Dominicanas. Religiosos de vida ativa são os Beneditinos, que também têm vida contemplativa, os Dominicanos, Franciscanos, Agostinianos, Jesuítas, etc.

Religiosos Contemplativos

As Ordens Contemplativas têm por finalidade especial a união com Deus pela oração, recolhimento e penitencia. Sua razão de ser está no valor inestimável da vida de oração e no valor expiatório da mortificação, tantas vezes ressaltado por Nosso Senhor.

Os Cistercienses. São um ramo beneditino que se formou na segunda metade do século XI, quando as disputas sobre o rigor ou a mitigação da Regra agitavam a abadia de Cluny. Roberto, Abade de Molesme criou em 1098 o mosteiro de Citeaux (Cistercium), retirando-se com alguns companheiros à solidão absoluta e praticando a vida de oração e de renúncia a toda comodidade. O terceiro Abade, S. Estevão Harding, instituiu capítulos gerais, visitas anuais aos mosteiros e um governo geral. Escreveu a constituição dos cistercienses, a Carta de Caridade, aprovada por Calixto III em 1119. Fundou vários mosteiros, dentre os quais o famoso de Claraval, cujo primeiro Abade foi São Bernardo, que viveu de 1091 a 1153. São Bernardo foi o insigne propagador da vida cisterciense. Durante um século a Ordem se distinguiu por grande fervor. Em seguida houve decadência, em virtude da qual veio a reforma do Abade Rance, que deu origem aos Trapistas.

Os Cartuxos. A Ordem Cartusiana foi fundada por São Bruno de Colônia, que em 1084 retirou-se para um lugar selvagem pouco afastado de Grenoble, onde reuniu ao redor de si alguns monges. Os Religiosos edificaram pequenas casas a certa distância uma da outra, nas quais habitavam, levando vida solitária. Assim formou-se a primeira Cartuxa, também chamada Grande Cartuxa.

São Bruno não escreveu Regra, mas adotou a de São Bento, prescrevendo, entretanto, o extremo rigor na sua observância. Os Cartuxos se distinguem até nossos dias pela fidelidade a esse modo edificante de vida. Por isso, com razão diz-se da Ordem Cartusiana — "nunquam reformata quia nunquam deformata", nunca foi reformada porque nunca deformada.

Ainda hoje cada Religioso vive isolado em pequenas casas e dedica-se à oração e meditação, estuda e executa trabalhos manuais. Todos os dias têm Missa Conventual cantada. Rezam diariamente o Ofício do dia, o de Nossa Senhora e o de Defuntos. Deitam-se pelas seis e meia da tarde para levantar quatro horas depois e cantar Matinas e Laudes do Ofício do dia, até duas ou duas e meia da madrugada, quando voltam ao descanso por mais umas três horas.

Observam o silêncio contínuo, com breves interrupções em certos dias. Jejuam de 14 de Setembro até a Ressurreição, além do dia de jejum semanal, e então sua ceia se compõe de uma taça de vinho e um pedaço de pão. Abstêm-se de laticínios no Advento e na Quaresma. Recebem os últimos sacramentos em presença da comunidade e são sepultados sem caixão, cobertos somente pelo hábito. Sobre a terra é colocada uma cruz de madeira e nada mais. Vestem-se de uma sarja branca, com escapulário cingido ao lado por uma cinta, e capuz.

A eles se deve a construção de muitas igrejas e institutos caritativos. Os cartuxos também fabricam o famoso licor Chartreuse.

Os Camaldulenses. São o ramo beneditino fundado por São Romualdo, que viveu de 907 a 1027. Originário de Ravena, de nobilíssima família ducal, aos vinte anos despojou-se de todas as riquezas que lhe cabiam como único herdeiro e ingressou num mosteiro da Ordem de São Bento. Aí viveu três anos de vida austera, findo os quais, sentindo-se chamado por Deus o maior silêncio e recolhimento, com licença do Abade, retirou-se para a vida solitária nos bosques de Veneza, onde formou uma comunidade.

O nome camaldulenses vem da grande ermida que construíram no lugar chamado Campus perto de Arezzo.

Esses Religiosos vivem ainda hoje em pequenas casas, que eles mesmos constroem, guardando silêncio absoluto e perpétuo e fazendo oração e penitência. Levantam-se à meia noite e meia para rezar e fazer meditação. Todas as sextas-feiras jejuam a pão e água. Observam o Advento e a Quaresma com a abstenção de carne, laticínios e ovos. O hábito é constituído de uma túnica branca, cinto, capuz, e cógula, que é uma espécie de capa, também branca.

Pertenceram à Ordem Camaldulense São Pedro Damião e o grande Papa Gregório XVI.

Os Trapistas. Nasceram de uma reforma no ramo cisterciense da Ordem de São Bento, empreendida por um Abade comendatário, e depois efetivo, Jean Bernard de Bouthillier de Rancé. O Abade Rancé fundou a Abadia de Nossa Senhora das Trapas, assim chamada porque o nome trapa, que em dialeto normando significa degrau, lembrava o terreno acidentado que se devia descer para chegar ao fundo do vale encharcado onde foi construída a abadia.

Os Trapistas têm por obrigação a tudo antepor a vida de oração, estudo e trabalho, sem deixar tempo algum para recreio. O Ofício Divino é rezado diariamente em coro. Estão proibidos de se alimentar de carnes, peixes e ovos. Têm dormitório comum, onde as camas estão separadas por uma divisão. Deitam-se sem tirar o hábito. Este é constituído de túnica branca, escapulário negro de lã, cinto de couro e cógula branca.

Vivem em clausura perpétua e não falam entre si, mas só com o Superior, e assim mesmo só em caso de necessidade e nunca à noite, que é dita do "grande silencio". Estão obrigados a se sustentar com o trabalho das próprias mãos, dedicando-se à agricultura e à criação.

Para dar ideia do rigor da disciplina religiosa entre os Trapistas costuma-se lembrar um episódio ocorrido numa Trapa em França. Rezavam os monges o Ofício Divino no coro, quando sobreveio um terremoto, fazendo vacilar a igreja e abrindo fendas nas paredes. O ofício não foi interrompido.

Os Trapistas foram muito perseguidos no tempo da Revolução Francesa e também nas guerras napoleônicas, pelo que foram forçados a migrar pela Europa. Atualmente há cerca de 3.000 monges trapistas, que seguem com todo o rigor os antigos costumes cistercienses.

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Em próximo artigo apresentaremos alguns dados acerca das ordens contemplativas femininas, bem como das ordens religiosas de vida ativa.


NA ERA DA MEDIOCRACIA

 

Cunha Alvarenga

"Peso morto de todas as mediocridades coligadas", eis como foi classificada a maçonaria através de inquérito realizado em um ambiente intelectual que estava longe de merecer o título de ultramontano.

E o ensino de hoje, sobretudo o universitário, que é onde por excelência se faz sentir o terrível bafo desse espírito sectário, chegou à perfeição "idórtica" da produção em série de fornadas e mais fornadas de homúnculos cheios de presunção e de incredulidade, sobrecarregados dessa meia ciência que é um dos sinais característicos da decadência do mundo moderno.

Pelo desprezo da Teologia, os corifeus do ensino leigo foram gradualmente transformando a filosofia em mero torneio literário, ao mesmo tempo que isolava a ciência do ramo geral dos conhecimentos, cingindo-a ao sensível ou ao mundo físico e admitindo no inteligível apenas as ciências exatas ou matemáticas. A terra se encheu, assim, de cidadãos com um erudito e enciclopédico conhecimento de coisas pequeninas, mas completamente nulos no que diz respeito às coisas grandiosas realmente dignas de serem investigadas.

Eis porque já dizia Blanc de Saint-Bonnet que nos achamos na era da "mediocracia". Destruída uma ordem de coisas baseada no respeito de Deus e no conceito hierárquico ou aristocrático da sociedade, Guizot havia anunciado o advento do reino das classes médias. "Tudo passou, com efeito, a ser bem medíocre: as ideias, as artes, a maneira de sentir, a maneira de governar e de instruir os homens". (A. Blanc de Saint-Bonnet em "La Légitimité").

Mas isto foi no século passado, na civilização da máquina a vapor e do bico de gás. Temos em mãos um livro ultramoderno que retoma esse mesmo tema da superstição científica de que continua sendo vítima a época do radar e da energia atômica.

(*) "SCIENCE IS A SACRED COW" — por Anthony Standen — Editores: — E. P. Dutton & Co. Inc. — New York — 1950.

Pelo fato de se colocar uma cartola e um fraque em um silvícola de Tanganika, nem por isso se vai dizer que ele se tornou civilizado. Ora, o respeito supersticioso dispensado pelo público em geral à ciência e aos cientistas, é uma prova de que culturalmente a maioria dos habitantes dos chamados países civilizados continua literalmente de cartola, fraque, tanga e pés descalços. Embora possam andar de automóvel e tenham televisão em casa, conservam a rusticidade de espírito de um selvagem. É o que Anthony Standen deixa entrever ao dizer que quando um cientista momentaneamente larga seu microscópio ou seu cíclotron e faz alguma declaração ao público em geral, ele talvez não seja compreendido, mas pelo menos ninguém porá em dúvida suas palavras. Estadistas, industriais, sacerdotes, líderes políticos, filósofos, todos são postos em quarentena ou criticados, mas os cientistas — nunca. Tem estes o monopólio da fórmula mágica: “Foi cientificamente provado que...”

Esse culto cego e irracional da ciência, pelo qual são responsáveis os cientistas com seu dogmatismo balofo, é uma das maiores calamidades do mundo moderno e uma das maiores fontes da mediocridade ambiente. Assim é que nem os físicos nem os biologistas se preocupam com a existência de Deus (ou pelo menos só o fazem aos domingos, quando estão de folga), pois não parece a eles que isto seja condizente com a sua posição de cientistas. Serão sempre, portanto, limitados em seus pontos de vista. O mesmo se pode dizer dos psicólogos, que nada têm a dizer sobre coragem, humildade, prudência, temperança, nem distinguem uma virtude intelectual de uma virtude moral, embora vivam a citar "complexos", "neurons", "axons" e "dendrites". Quanto aos "Cientistas sociais" também são industriosos e prolíficos como as abelhas. Enquanto não chega o Galileu social, passam o tempo a escrever trabalhos tais como: "Desenvolvimento de demoscópios para pesquisas sociais" — "Da densidade de população em relação à propinquidade residencial como um fator na seleção matrimonial", etc.

Baseados em dados mais que precários, os cientistas sociais costumam generalizar e assegurar que podem predizer os acontecimentos sociais. Mas em tudo o que entra a volição humana, a começar pelos horários das estradas de ferro, há sempre a possibilidade, e frequentemente a realidade dos trens ou coisas correlatas não obedecerem à previsão. Quem sabe, por exemplo, quando uma bomba atômica vai tornar completamente errada a tabela de mortalidade de Hartford, Connecticut? Pois apesar de toda a deficiência das ciências sociais, e sobretudo de ciências sociais tão longe da realidade em toda a sua riqueza e complexidade, há quem nelas confie até o ponto seguinte, como o faz o dr. E. U. Condon, ex-diretor da Comissão de Energia Atômica e atual chefe do "Bureau Nacional de Padrões": "Em resumo, a maior contribuição à segurança real que a ciência pode dar é através da extensão do método científico às ciências sociais e a solução do problema de evitar completamente a guerra". Observa Standen que qualquer informação de valor sobre uma futura guerra teria de incluir o conselho secreto do Politburo, e que cientista social pode nos dizer algo a respeito?

Quanto à matemática, seu estudo é realmente importante, mas por uma razão difícil de ser admitida pela opinião científica dominante. Pode-se aquilatar seu valor pelo mito da caverna, de Platão. Dá este filósofo uma imagem geométrica do conhecimento. Trata-se de uma reta dividida em duas partes desiguais. A porção menor, correspondente ao inteligível, se divide entre as matemáticas e a alta sabedoria, de modo tal que a porção linear destinada a representar as coisas, ou o mundo físico, tem uma grandeza correspondente à porção da reta reservada às matemáticas, isto é, estas podem se ajustar ao mundo dos objetos. Mas os cientistas modernos param nas matemáticas, não se atrevendo a ir além, isto é, a ingressar no campo da alta sabedoria, que é justamente o mais rico, o mais importante do esquema de Platão. O próprio Platão é um tanto vago quando a ele se refere, e isto porque, apesar de ser um grande filósofo e poeta, era apenas um teólogo indiferente. "Mas mesmo um teólogo indiferente, diz o Autor, é melhor que um moderno cientista". Consequentemente, os modernos cientistas não sabem verdadeiramente para que existe a ciência. Apenas conhecem a ciência "pura", que é a ciência que se compraz em si mesma, e a ciência "aplicada", destinada a trazer benefícios materiais para o homem. Entretanto, a finalidade primeira da ciência é conhecer a Deus e admirá-Lo através da Criação. Se qualquer utilidade nos vem disso — como de fato acontece com grande frequência — tanto melhor. Se os cientistas olhassem para seu trabalho desse modo, deixariam de adorar a ciência como uma vaca sagrada e seriam melhores cientistas, fugindo ademais do ridículo a que constantemente estão se expondo.

Eis um livro digno de ser lido pela nossa mocidade estudiosa e capaz de arrancar de muitos cérebros jovens as teias de aranhas que nos vêm dos tempos de Auguste Comte.