VERBA TUA MANENT IN AETERNUM
OS MALES TERRIVEIS QUE O DIVÓRCIO ACARRETA
LEÃO XIII: Em verdade, é custoso ter necessidade de dizer quantas consequências funestíssimas encerra em si o divórcio. Com ele as alianças matrimoniais tornam-se instáveis, o afeto mútuo enfraquece, a infidelidade recebe perniciosos incitamentos, ficam comprometidas a proteção e a educação dos filhos, proporciona-se ocasião de se dissolverem as sociedades domésticas, semeiam-se no seio da família os germes da discórdia, diminui-se e abate-se a dignidade da mulher, porque corre o perigo de ser abandonada depois de ter servido às paixões do homem. E, como nada contribui mais para arruinar as famílias e enfraquecer os Estados do que a corrupção dos costumes, fácil é reconhecer que o divórcio é, sobretudo, o inimigo da prosperidade das famílias e dos povos, visto que, sendo a consequência dos costumes depravados, abre a porta, como a experiência o demonstra, a uma depravação ainda mais profunda dos costumes particulares e públicos. Todos reconhecerão que estes males serão ainda muito maiores, se refletirem que, desde o momento em que o divórcio haja sido autorizado, não haverá freios bastante fortes para mantê-lo dentro dos limites fixos que a princípio pudessem ser-lhe assinalados. É muito grande a força do exemplo, maior ainda a das paixões; e, graças a esses estímulos, forçosamente deve suceder que, tornando-se cada dia mais geral e profundo o desejo infrene do divórcio, invada maior número de almas como uma doença que se propaga pelo contagio, ou a maneira das águas represadas que, tendo triunfado dos diques que as sustinham, irrompem por tocas as partes (Encíclica "Arcanum Divinae Sapientiae", de 10-11-1880).
A PIEDADE É O PRIMEIRO E GRANDE APOSTOLADO NA IGREJA
PIO XII: A força irresistível de qualquer espécie de apostolado cristão e a piedade, da qual disse São Paulo que "é útil para tudo e tem a promessa da vida presente e da futura" (1, Tim. 4, 8). A piedade é em si mesma o primeiro e grande apostolado na Igreja de Jesus Cristo; e aquele que pretendesse, em favor da atividade externa, reduzir-lhe o cultivo ou tê-la em menor consideração, mostraria ter pouca ou nenhuma compreensão da essência do Cristianismo, de seu núcleo substancial, que é a união da alma a Deus no amor operoso e obediente (Alocução ao Congresso Internacional dos Cooperadores Salesianos, de 13-IX-1952).
OS VERDADEIROS AMIGOS DO POVO SÃO TRADICIONALISTAS
B. PIO X: Que eles estejam persuadidos de que a questão social e a ciência social não nasceram ontem; que, em todos os tempos, a Igreja e o Estado, em feliz acordo, suscitaram para isto organizações fecundas; que a Igreja, que jamais traiu a felicidade do povo em alianças comprometedoras, não precisa livrar-se do passado, bastando-lhe retomar, com o auxílio de verdadeiros artífices da restauração social, os organismos quebrados pela Revolução, adaptando-os, com o mesmo espírito cristão que os inspirou, ao novo ambiente criado pela evolução material da sociedade contemporânea; porque os verdadeiros amigos do povo não são nem revolucionários, nem inovadores, mas tradicionalistas (Carta Apostólica "Notre Charge Apostolique", de 25-VIII-1910).
O PRIMEIRO DEVER DE CARIDADE PARA COM OS QUE ERRAM, É O ZELO DE SUA CORREÇÃO
B. PIO X: O mesmo acontece com a noção de fraternidade, cuja base eles colocam no amor dos interesses comuns, ou, além de todas as filosofias e de todas as religiões, na simples noção de humanidade, englobando assim no mesmo amor e numa igual tolerância todos os homens com todas as suas misérias, tanto as intelectuais e morais como as físicas e temporais. Ora, a doutrina católica nos ensina que o primeiro dever da caridade não está na tolerância das convicções errôneas, por sinceras que sejam, nem na indiferença teórica e prática pelo erro ou pelo vício em que vemos mergulhados nossos irmãos, mas no zelo pela sua restauração intelectual e moral, não menos que por seu bem estar material. Esta mesma doutrina católica nos ensina também que a fonte do amor do próximo se acha no amor de Deus, Pai comum e fim comum de toda a família humana, e no amor de Jesus Cristo, do qual somos membros a tal ponto que consolar um infeliz é fazer o bem ao próprio Jesus Cristo. Qualquer outro amor é ilusão ou sentimento estéril e passageiro (Carta Apostólica "Notre Charge Apostolique", contra o "Sillon", de 25-VIII-1910).
PORQUE O MUNDO NÃO TEM A PAZ
PIO XII: Quando porém a Igreja e o seu Supremo Pastor se volvem da intimidade suave, pacificadora e reconfortante do Menino de Belém, para contemplar o mundo que vive longe de Cristo, sentem-se repassados por uma corrente de ar gelado. Este mundo não fala senão de paz, mas não tem paz; reivindica para si, a fim de a estabelecer, todos os títulos jurídicos possíveis e impossíveis, mas não conhece ou não reconhece a missão pacificadora que emana imediatamente de Deus, a missão de paz da autoridade religiosa da Igreja. Pobres míopes, cujo restrito campo visual não se estende além ao que se pode encontrar na hora presente, nem ultrapassa as cifras das possibilidades militares e econômicas! Como haveriam eles de fazer a menor ideia do peso e importância da autoridade religiosa na solução aos problemas da paz? Espíritos superficiais, incapazes de ver, em toda a verdade e amplidão, o valor e a força criadora do Cristianismo, como não haveriam de sentir ceticismo e desprezo a respeito do poder pacificador da igreja? Outros porém — e queira Deus sejam maioria — dar-se-ão conta, mais ou menos conscientemente, que esbulhando a autoridade religiosa da Igreja aos requisitos para uma ação eficaz em favor da paz, só se conseguiu tornar mais grave a condição trágica do conturbado mundo hodierno (Radio mensagem do Natal de 1951).
A PERSONIFICAÇÃO PERMANENTE DA REVOLUCÃO
LEÃO XIII: E nesta obra perniciosa e desleal distingue-se uma seita tenebrosa, que a sociedade traz de há longos anos no seio, como uma doença mortal que lhe contamina a saúde, a fecundidade e a vida. Personificação permanente da revolução, constitui uma espécie de sociedade às avessas, cujo escopo é um predomínio oculto sobre a sociedade, e cuja razão de ser consiste na guerra a Deus e à Igreja. Desnecessário se torna nomeá-la, pois todos reconhecem por estes sinais a maçonaria, da qual já falamos propositadamente, na Nossa Encíclica "Humanum Genus", de 20 de abril de 1884, denunciando-lhe as maléficas tendências, a falsa doutrina e a obra nefasta (Encíclica "Parvenu à la vingt-cinquième année", de 19-III-1902).
A PARTICIPAÇÃO NQS ATOS LITÚRGICOS NÃO DISPENSA DOS EXERCICIOS DA PIEDADE PRIVADA
PIO XII: Por graves motivos a Igreja prescreve aos Ministros do altar e aos Religiosos, precisamente porque são destinados de modo particular a realizar as funções litúrgicas do sacrifício e do louvor divino, que, nos momentos estabelecidos, atendam à meditação piedosa, ao exame diligente e à emenda da consciência, e aos outros exercícios espirituais (Encíclica "Mediator Dei", de 20-XI-1947).
Cinqüenta anos de atividades da Pontifícia Comissão Bíblica
Prestou inestimável concurso ao Bem-aventurado Pio X no combate ao modernismo
Há cinquenta anos, a 30 de outubro de 1902, Leão XIII; pela Carta Apostólica "Vigilantiae", criou a Comissão Pontifícia para os Estudos Bíblicos. Havia mais de um ano que o Papa vinha preparando tudo o que era necessário para o funcionamento regular do novo dicastério, tanto assim que já em agosto de 1901 nomeara doze consultores para assistir os três Purpurados que seriam os primeiros membros da Comissão, colocando à sua frente o sábio Cardeal Parocchi, então Vive-Chanceler da Santa Igreja Romana.
O grande Pontífice havia exposto, com admirável clareza, na encíclica "Providentissimus Deus" de 18 de novembro de 1893, os princípios fundamentais da exegese católica, havia dado as normas gerais para a sua aplicação aos problemas então atuais, e havia posto em guarda os fiéis contra as doutrinas falsas ou perigosas de uma crítica imprudente que ameaçava penetrar até nas fileiras dos intérpretes católicos. Mas, bem cedo se convenceu de que, apesar de sua solicitude, o perigo das tendências muito ousadas persistia, e mesmo se tinha agravado. Foi então que decidiu criar uma Comissão Pontifícia especial, para velar no sentido de que os Livros Sagrados fossem estudados com a maior diligencia à luz das novas descobertas e pesquisas científicas, mas fossem ao mesmo tempo protegidos contra qualquer opinião errônea ou temerária. A nova Comissão devia ser um guia seguro para a aplicação prática dos princípios sabiamente estabelecidos na encíclica "Providentissimus Deus", e para o prudente aproveitamento dos resultados obtidos pela crítica, a arqueologia, a filologia, a história e a ciência natural modernas.
Uma corporação internacional de cientistas
Para atingir esses objetivos, foram postos à disposição dos Cardeais membros da Comissão, numerosos consultores competentes nos diversos ramos da ciência bíblica e do orientalismo, escolhidos entre os sábios de diversas regiões e nações. Com as primeiras nomeações, o número dos consultores chegou a quarenta, membros do Clero secular e regular, residindo em grande parte fora de Roma.
Ainda hoje a Comissão Bíblica conserva esse caráter internacional. De fato, conta ela trinta e um consultores, selecionados entre os melhores exegetas e orientalistas do mundo católico: alemães, franceses, italianos, holandeses, espanhóis, austríacos, belgas, irlandeses, e norte-americanos. Somente onze desses consultores residem em Roma: graças a essa circunstância a Comissão está sempre informada dos movimentos, das iniciativas, das pesquisas e publicações, das tendências que se manifestam nos diversos países, bem como dos perigos que possam, aqui e acolá, ameaçar a ortodoxia da ciência escriturística.
Atualmente a Comissão é dirigida pelo Eminentíssimo Cardial Eugenio Tisserant, conhecido no mundo científico como um ilustre orientalista. S. Eminência exerce essas funções desde 1937.
Os trabalhos da Comissão - A luta contra o modernismo
A atividade da Comissão foi cuidadosamente regulamentada em 1903 pelo regimento interno que lhe deu Leão XIII, definindo as atribuições e a tarefa dos Cardeais e dos consultores. Durante seus primeiros anos, a Comissão se limitou a estudar e a aprofundar, em sessões realizadas duas vezes por mês, os difíceis problemas bíblicos então em discussão entre os católicos. Mas em 1905 foi publicado o primeiro decreto oficial, que trata das "citações implícitas". Seguiram-se, sob o pontificado do Bem-aventurado Pio X, treze outros decretos, em que foram resolvidas importantes questões exegéticas do Antigo e do Novo Testamento, relacionadas com as novas pesquisas críticas, arqueológicas, históricas e filológicas. Em 1907, Pio X, guardião vigilante da fé e da tradição católica e, ao mesmo tempo, organizador prudente e prático, definiu a autoridade dos decretos da Comissão, colocando-os no mesmo plano que os decretos doutrinais das Congregações Romanas aprovados pelo Soberano Pontífice (Motu Próprio "Praestantia Scripturae Sacrae", de 18 de novembro de 1907).
A época era agitada: a crítica não católica atacava, com uma virulência até então nunca vista, as posições tradicionais da ciência bíblica, e, no campo mesmo dos sábios católicos, havia o modernismo, conjunto monstruoso de erros e de falsas doutrinas, especialmente nas questões bíblicas. Visivelmente guiado e iluminado pelo Espírito Santo, o enérgico Pontífice, servindo-se da Comissão fundada pelo seu grande Predecessor, opôs uma barreira às tendências dos inovadores em matéria de exegese, e reconduziu a ciência bíblica às antigas e seguras rotas tradicionais. Será sempre um mérito da Comissão Bíblica o de ter assistido o Papa nessa tarefa delicada e difícil.
Depois da crise modernista
Depois, quando a mentalidade dos eruditos, a partir da primeira guerra, mudou e, pouco a pouco, voltou-se a considerações mais sóbrias e tranquilas, a Comissão pôde se consagrar a um trabalho mais positivo. Sob Bento XV só foi publicado um decreto, em 1915; sob Pio XI três outros se seguiram, mas relativos a questões particulares de exegese ou de caráter prático. O interesse da Comissão Pontifícia se dirige agora mais especialmente sobre a tarefa de promover os estudos bíblicos, tanto entre especialistas como entre futuros Padres, alunos de Seminários. Esta atividade tem se manifestado por diversas Instruções sobre questões de interesse geral, seja doutrinário, seja didático. É assim que, entre outras, se tem a Carta aos Arcebispos e Bispos da Itália, de 20 de agosto de 1941, a carta ao Cardeal Suhard, de 16 de janeiro de 1948, e, como resumo e coroação deste trabalho positivo, a recente Instrução "sobre a maneira de bem ensinar a Sagrada Escritura nos Seminários e nos colégios religiosos". Apoiado pela Sagrada Congregação dos Seminários, este documento deu novo impulso aos estudos escriturísticos nos ateneus eclesiásticos, como a demonstra claramente o crescente número de candidatos que se apresentam aos exames da Comissão, e dos jovens Padres que se matriculam no curso do Instituto Bíblico Pontifício.
AMBIENTES, COSTUMES, CIVILIZAÇÕES
ARTE SACRA, ESPÍRITO NATURALISTA
Plinio Corrêa de Oliveira
QUANDO se entra na galeria dos espelhos, em Versalles, a primeira impressão que se tem é de vastidão. Imenso é o soalho, em cuja superfície polida a luz que entra de várias partes parece encontrar campo aberto e livre para seus jogos multiformes. O comprimento e a altura das paredes são acentuados pelos arcos altos e estreitos que de um lado dão vista para as vastidões do parque, e do outro estão guarnecidos de espelhos cujos reflexos ampliam ainda mais as perspectivas. O teto abaulado, na riqueza exuberante de sua policromia ostenta tal número de figuras alegóricas que faz ressaltar ainda mais a vastidão de todo o conjunto.
Mas a esta primeira impressão se sobrepõe logo outra: a de proporção. Proporção admiravelmente harmoniosa entre a altura, a largura e o comprimento da sala. Proporção igualmente harmoniosa entre os vários elementos decorativos da parede que se vê ao fundo: o arco está numa relação perfeita com o abaulado do teto, com a largura e a altura da sala. Os painéis de um e outro lado do arco estão exatamente proporcionados entre si e com as respectivas paredes. Os jarrões não podiam ser senão o que são. O lustre da sala contígua, que se entrevê ao fundo, tem precisamente o tamanho necessário para ser visto através do arco. Observações iguais poderiam ser feitas acerca de cada um dos múltiplos elementos decorativos que guarnecem a galeria.
Uma mesma harmonia forte, quase se diria inflexível, penetra, ordena, triunfa em tudo, sujeitando todas as formas, todas as linhas, todas as cores, ao domínio de um grande pensamento central, que reina e refulge até nos mais insignificantes pormenores. É um pensamento cheio de grandeza, de coerência, de força, de graça e de amenidade, imagem fiel da ideia que o absolutismo fazia da ordem temporal: uma relação harmônica de todas as coisas, constituída e mantida pelo império da vontade forte, esclarecida, paternal, e sempre invencível do Rei.
Esta harmonia tem um que, não só de triunfante, mas de festivo. A sala é feita para a glória e o prazer. Ela traz em si a fisionomia de uma sociedade que julgava ter adquirido sua estabilidade perfeita repousando na vontade do Rei como em seu centro de gravidade normal. E com a estabilidade a despreocupação, a fartura, o bem estar perfeito da vida terrena.
Bem estar terreno – faça-se justiça – que é espiritual no mais alto grau. Todo o prazer que esta sala pode dar dirige-se antes de tudo ao deleite da alma e nesta procura, desperta, nutre o que há de mais nobre. O ambiente dignifica e faz com que o homem se sinta o que realmente é: o rei da natureza.
BEM estar terreno, glória terrena, prazer terreno, ordem natural: tudo isso se exprime com admirável nitidez e inteligência nesta sala. A natureza é criada por Deus, e é boa e bela em si. Esta bondade e beleza da vida terrena puramente natural pode e deve ser reconhecida pelo artista ou pelo pensador católico.
Mas basta-lhe isto? Onde está a ideia do pecado original, da luta entre o bem e o mal, da necessidade da mortificação, da morte, e, para além da morte, do inferno ou do Céu? Onde a ideia de um Redentor que padeceu e morreu por nós num oceano de dores inexprimíveis? Onde todos os valores da Revelação e da Redenção, tão presentes e tão vivos na arte medieval? Onde, em uma palavra, a Cruz de Nosso Senhor Jesus Cristo?
E por isto mesmo, por mais que neste ambiente se reconheçam qualidades de alma admiráveis, as mesmas qualidades contra as quais a Revolução de 1789 se levantou, se o comparamos ao gótico devemos reconhecer que nele se nota muito mais o sopro do pensamento pagão do que a marca do Santo Batismo.
Os homens que dançavam na Galeria dos espelhos rezavam na Capela do Palácio de Versalhes. Não se diria que esta é um prolongamento, um complemento daquela? O tema das pinturas é religioso; mas as atitudes, os gestos, a expressão dos Santos são mais ou menos os dos deuses mitológicos da sala dos espelhos. Os arcos, a colunata têm um que de aparatoso e festivo. Tudo respira correção natural, ordem, compostura, nada exprime misticismo – no bom sentido do termo, é claro – e fervor sobrenatural. Parece uma capela de homens felizes e auto-suficientes, que não desejam senão uma vida terrena próspera, e que aí vem ver a Deus por mero dever de amável cortesia. Nada parece preparado para dar ambiente à prece de homens sofredores, em luta contra o mundo, o demônio e a carne, e sôfregos do Céu.
O naturalismo da época marcou nestes dois exemplos sua influência não só na vida temporal como na vida