Repercute em todo o País a Pastoral do insigne Bispo de Campos

PODE-SE afirmar desde já, que a Carta Pastoral do Exmo. Revmo. Sr. Bispo D. Antonio de Castro Mayer, sobre "Problemas do Apostolado Moderno", tão útil e oportuna para esta Diocese, transcendeu de muito o âmbito regional, para se transformar num dos acontecimentos religiosos de maior repercussão nacional nestes últimos anos.

Com efeito, apenas distribuídos os primeiros exemplares, dela começaram a falar nos termos mais elogiosos os principais órgãos da imprensa diária do Rio de Janeiro e de São Paulo. Daí, a notícia de que o ilustre Bispo de Campos, tão conceituado em todos os círculos intelectuais católicos, havia publicado uma Pastoral de flagrante atualidade, se propagou rápida por todo o país. O público em consequência começou a pedir a Pastoral nas livrarias, antes mesmo de estas a haverem recebido da editora "Boa Imprensa Ltda.".

Ao mesmo tempo, chegavam a S. Excia. Revma., em cartas, telegramas e cartões, expressivas manifestações de admiração e aplauso ao seu monumental trabalho. Estas manifestações provinham, não só de figuras da maior projeção no Venerando Episcopado Nacional, como de personalidades do Clero Secular e Regular, Religiosas, dirigentes de associações católicos, etc.

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Como é natural, o que mais tem impressionado na Carta Pastoral é a admirável solidez da doutrina que expõe, a clareza dos argumentos em que se funda, a abundância dos documentos eclesiásticos que cita.

Há entretanto, na Pastoral, outros pontos que tem sido objeto de encômios.

Assim, é geralmente aplaudido o seu equilíbrio. Sagacíssima em anotar as diversas proposições impugnadas, ela se mostra eximia em distinguir em cada uma a verdade, do erro, de tal forma a golpear a este sem jamais atingir àquela.

Este equilíbrio se nota igualmente na linguagem da Pastoral. Sua argumentação é cerrada, inflexível, e cessa somente quando o erro está desmascarado e abatido. Mas ao longo de toda a demonstração, o tom é sempre sereno, objetivo, por assim dizer cientificamente desapaixonado.

Tem igualmente merecido geral aplauso a forma de "Catecismo" que o Exmo. Revmo. Sr. Bispo Diocesano deu à segunda parte de sua Pastoral. Este método de exposição, que permite uma apreensão fácil, clara, direta, de todo o assunto tratado, contribui poderosamente para auxiliar o leitor a ver claro na atmosfera doutrinaria confusa dos dias em que vivemos.

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Campos tem sido no cenário político, intelectual e econômico do Brasil uma cidade ilustre pelo destaque dos muitos filhos de valor que produziu.

Agora, o renome de Campos no terreno religioso, já firmado pelas virtudes dos Prelados venerandos que aqui estiveram, toma também projeção nacional pelo documento invulgar que devemos ao grande Bispo campista, por adoção e coração, que é Dom Antonio de Castro Mayer.


Deveres do Estado Católico para com a Religião

O Eminentíssimo Cardial Alfredo Ottaviani é uma das figuras mais em evidência no Sacro Colégio, não só por ser Pró-Secretário da Suprema Sagrada Congregação do Santo Oficio como ainda por seus altos dotes de inteligência, cultura e piedade. Sua palavra se reveste, pois, de particular autoridade.

No dia 2 de março próximo passado Sua Eminência pronunciou, na aula Magna do Pontifício Ateneu Lateranense, uma conferência tomando por tema "Os deveres do Estado para com a Religião". A importância do tema, o brilho e a profundidade do desenvolvimento que lhe deu o ilustre conferencista, fizeram dessa conferencia um acontecimento que transcendeu de muito a importância de um simples fato da vida universitária para repercutir em todo o orbe católico.

Publicando hoje a primeira parte desse trabalho, fazemo-la preceder da nota com que o Eminentíssimo Purpurado o entregou à publicidade.

NÃO teria pensado em entregar à imprensa a conferência que pronunciei no dia 2 de março de 1953 no Salão Nobre do Pontifício Ateneu Lateranense, se não me tivesse impelido a fazê-lo grande número de solicitações da parte de publicistas e de membros do Corpo docente de diversos Institutos de Estudos superiores, que insistiram sobre a oportunidade de divulgar quanto expus naquela solene Assembléia.

"De há muito — escreveu-me distinto Religioso — o Direito Público da Igreja não conhece outro ambiente que não seja o das aulas reservadas dos Institutos eclesiásticos, enquanto que é urgente a necessidade de divulgá-lo em todos os grupos sociais, principalmente os mais elevados. A imprensa cala-se por princípio, dirigida como é por homens que tem o culto da liberdade muito mais do que o da verdade... A desorientação geral a que assistimos, as perplexidades dos homens de Estado e os próprios erros enormes que se cometem nas uniões hibridas entre Estados e partidos reclamam que o problema capital das relações entre Estado e Igreja seja posto apertis verbis, que se discorra amplamente a respeito e com a maior clareza, e, sobretudo, sem medo. A coragem cristã é a virtude cardeal que se chama fortaleza". Todas estas vivas insistências convenceram-me de quanto hoje, mais do que em qualquer outro tempo, é necessário que todo sacerdote, e todo leigo que colabora no apostolado do Clero imitem, na medida que lhes e possível, o exemplo ao Divino Mestre, que disse de Si: “Ad hoc veni in mundum ut testemunium perhibeam veritati" (Joan. 18, 37) (1).

Alguém, talvez, notara que não citei autores, embora referindo uma vez ou outra textualmente algumas afirmações. Abstive-me por dois motivos: primeiramente porque pouco importa saber que certas idéias são defendidas por este ou aquele escritor, quando se acham de tal modo difundidas a ponto de não mais se poderem considerar como próprias de determinado individuo; além disso quis seguir a norma de Santo Agostinho, que ensina a combater não os que erram, mas o erro. E assim agindo segui também o programa e o exemplo do augusto Pontífice gloriosamente reinante, que tornou como lema de seu Pontificado: "Veritatem facientes in caritate".

DEVERES DO ESTADO CATÓLICO PARA COM A RELIGIÃO

Que os inimigos da Igreja tenham em todos os tempos hostilizado Sua missão negando algumas de Suas divinas prerrogativas e poderes — ou mesmo todos eles — não é de admirar.

O ímpeto do assalto, com seus falazes pretextos, prorrompeu já contra o Divino Fundador desta bimilenar e sempre jovem instituição: contra Ele bradou-se - como se brada ainda hoje - "Nolumus hunc regnare super nos!" (Luc. 19, 14) (2).

E com a paciência e serenidade que nascem da segurança de seus destinos profetizados e da certeza de Sua missão divina, a Igreja canta pelos séculos: "Non eripit mortalia qui regna dat caelestia:" (3).

Manifesta-se porem em nós o espanto, e cresce até ao pasmo e se expande em tristeza, quando a tentativa de arrebatar as armas espirituais de justiça e verdade das mãos desta Mãe benéfica que é a Igreja, é efetuada justamente pelos seus filhos: e até por aqueles filhos que, achando-se em Estados interconfessionais, vivendo em contacto contínuo com os irmãos dissidentes, deveriam sentir mais do que quaisquer outros o dever de gratidão para com esta Mãe que usou sempre dos Seus direitos para defender, custodiar e salvaguardar os seus próprios fiéis.

IGREJA CARISMÁTICA E IGREJA DO DIREITO?

Admitem hoje alguns somente uma ordem pneumática na Igreja, e por isso afirmam o princípio de que a natureza ao direito da Igreja está em contradição com a própria natureza da Igreja.

Segundo eles, o elemento sacramental original estaria se debilitando cada vez mais, para dar lugar ao elemento da jurisdição, que agora constitui a força e a potência da Igreja; prevaleceu a idéia, corno afirma o jurista protestante Sohm, de que a Igreja de Deus é constituída como o Estado.

Mas o can. 108, § 3, onde se fala da existência na Igreja do poder de ordem e do poder de jurisdição, baseia-se no direito divino. E que este fundamento é legítimo demonstram-no os textos evangélicos, as alegações dos Atos dos Apóstolos, as citações de suas Epistolas, frequentemente aduzidos pelos autores de Direito Público Eclesiástico, para provar a origem divina dos mencionados poderes e direitos da Igreja.

Na Encíclica "Mystici Corporis" o augusto Pontífice felizmente reinante se exprimiu, a esse propósito, nos seguintes termos: "Reprovamos o erro funesto dos que sonham uma igreja ideal, uma certa sociedade alimentada e formada pela caridade, à qual (não sem desprezo) opõem a outra a que chamam jurídica. Mas sugerem erroneamente tal distinção, pois não tomam em conta que o Divino Redentor quis que a sociedade de homens por Ele fundada fosse também uma sociedade perfeita no seu gênero, e dotada de todos os elementos jurídicos e sociais, para perpetuar na terra a obra salutífera da Redenção; e por isso quis que fosse enriquecida pelo Espírito Santo com dons e graças celestes" (A.A.S., vol. XXXV, p. 224).

Não quer portanto a Igreja ser um Estado; mas Seu Divino Fundador a constituiu como sociedade perfeita, com todos os poderes inerentes a tal condição jurídica, a fim de desempenhar Sua missão em cada Estado sem atrito entre as duas Sociedades, de que Ele é, de modo diverso, autor e sustentáculo.

ADESÃO AO MAGISTÉRIO ORDINÁRIO

E aqui surge o problema da convivência da Igreja com o Estado laico. Há católicos que, acerca deste assunto, estão divulgando idéias não de todo corretas.

A muitos de tais católicos não se pode negar nem o amor à Igreja, nem a reta intenção de encontrar um caminho de possível adaptação às circunstâncias dos tempos. Mas não é menos verdade que sua posição reflete a do delicatus miles que quer vencer sem combater, ou a do ingênuo que aceita uma insidiosa mão estendida, sem perceber que essa mão o levará depois a atravessar o Rubicon rumo ao erro e à injustiça.

O primeiro erro deles é justamente o de não aceitar na plenitude as arma veritatis e os ensinamentos que os Romanos Pontífices deste último século, e de modo particular o Pontífice reinante, Pio XlI, com encíclicas, alocuções e instruções de toda a sorte ministraram a esse propósito aos católicos.

Para justificar-se afirmam eles que, no conjunto dos ensinamentos promulgados pela Igreja, cumpre distinguir uma parte permanente e uma perecível, esta última devida ao reflexo de condições temporárias particulares.

Infelizmente, porém, estendem isto também aos princípios afirmados nos documentos pontifícios, a respeito dos quais se manteve constante o ensinamento dos Papas e que fazem parte do patrimônio da doutrina católica.

Nesta matéria a teoria do pêndulo, introduzida por alguns escritores ao examinar o alcance das encíclicas nas varias épocas, não pode aplicar-se.

L’Eglise — escreveu-se — scande l’histoire du monde a la manière d’un pendule oscillant qui, soucieux de garder la mesure, maintient son mouvement en le tenversant lorsqu’il juge le maximum d’amplitude atteint... Il y aurait toute une histoire des encycliques a faire sous cet angle : ainsi en matiere d’etudes bibliques: « Divino Afflante Spiritu « succède a «Spiritus Paraclitus », « Providentissimus ». En matière de théologie ou politique. « Summi Ponificaus », «Non abbiamo bisogno », « Ubi arcano Dei » succedent a « Immortale Dei » (Cfr. “Témoignage chretien”, de 1-IX-1950, referido em “Doc. Cath.” De 8-X-1950) (4).

Ora, se isto fosse entendido no sentido de que os princípios gerais e fundamentais do direito público eclesiástico, solenemente afirmados na "Immortale Dei", refletem apenas momentos históricos do passado, enquanto que depois o pêndulo dos ensinamentos das Encíclicas de Pio XI e Pio XII teria alcançado, em seu "renversement", posições diferentes, deveria então considerar-se essa tese totalmente falsa, não só porque não adequada ao conteúdo das próprias encíclicas, mas também porque teoricamente inadmissível.

O Pontífice reinante, na "Humani generis", nos ensina de que modo devemos aceitar nas encíclicas o magistério ordinário da Igreja: "Neque putandum est, ea quae in Encyclicis Litteris proponuntur, assensum per se non postulare, cum in iis Pontifices supremam sui Magisterii potestatem non exerceant. Magistério enim ordinario haec docentur, de quo illud etiam valet "Qui vos audit, me audit"; ac plerumque quae in Encyclicis Litteris proponuntur et inculcantur, jam aliunde ad doctrinam catholicam pertinent" (A. A. S., vol. XLIII, p. 568) (5). Alguns escritores nossos, sob o temor de serem acusados de querer voltar à Idade Média, não cuidam de considerar as posições doutrinárias constantemente afirmadas nas encíclicas como pertencentes à vida e ao direito da Igreja de todos os tempos. É para eles a admoestação de Leão XIII, que, recomendando a concórdia e a unidade no combate ao erro, acrescenta: "Et hac ex parte cavendum ne quis opinionibus falsis aut nullo modo conniveat, aut mollius resistat quam veritas patiatur" ("Immortale Dei", Acta Leonis XIII, vol. V, p. 148).

(1) "Para isso Eu vim ao mundo, para dar testemunho da verdade".

(2) "Não queremos que Ele reine sobre nós!"

(3) "Não rouba os reinos mortais Aquele que dá o reino dos Céus".

(4) "A Igreja marca a história do mundo à maneira de um pendulo oscilante que, preocupado em guardar a medida, mantém seu movimento invertendo-o quando julga ter atingido o máximo de amplitude... Haveria toda uma história das encíclicas a fazer sob esse ponto de vista: assim, em matéria de estudos bíblicos: "Divino afflante Spiritu" sucede a "Spiritus Paraclitus", "Providentissimus". Em matéria de teologia ou política: "Summi Pontificatus", ''Non abbiamo bisogno", "Ubi arcano Dei" sucedem a "Immortale Dei".

(5) "Nem se deve crer que os ensinamentos das encíclicas de si não exijam assentimento, sob alegação de que os Sumos Pontífices não exercem nelas o supremo poder de seu magistério. Pois tais ensinamentos procedem do Magistério ordinário, para o qual também valem aquelas palavras: "Quem vos ouve, a Mim ouve"; e, na maioria das vezes, o que é proposto e inculcado nas encíclicas, já por outras razões pertence ao patrimônio, da doutrina católica".


VERDADES ESQUECIDAS

É licito desprezar os pecadores

São Gregório Magno

Da Homilia 34 sobre os Evangelhos:

Os justos costumam desprezar retamente os pecadores, não por soberba, mas por zelo da disciplina.

Desprezam com efeito sem orgulho... movem perseguição, mas com, amor; pois que embora externamente increpem pela disciplina, internamente conservam a mansidão da caridade.