DIRETRIZES AOS FIÉIS
(continuação)
do Estado, da propriedade, das relações econômicas ou da educação.
7) Dado que, em concreto, os programas dos partidos têm geralmente, no Brasil, uma importância menor do que fora de se supor, o eleitor católico deve também, na medida do possível, considerar atentamente a pessoa do candidato, isto é, as convicções que externava anteriormente a seu ingresso nas lides partidárias, as que manifesta no círculo de suas relações, ou em seus discursos políticos. Deve ainda o eleitor atender ao modo de viver do candidato e a suas atitudes com relação aos problemas que interessam à Igreja. Pois dificilmente um compromisso aceito no fragor da luta eleitoral pode transformar um candidato em propugnador autorizado e eficiente de idéias que realmente não são as suas, nem correspondem a seu modo de viver.
8) Considerem os católicos que os destinos dos povos e os corações dos que os governam estão nas mãos de Deus. O voto, já o dissemos, constitui um dever grave. Dever mais imperioso ainda é rezar e oferecer sacrifícios para que o Brasil se reintegre plenamente nas normas da civilização cristã. Particularmente nos momentos de grandes apreensões, a prece é a principal arma dos filhos da Igreja. No passado, foi sobretudo pela oração que os grandes Pontífices e Monarcas instituíram a civilização cristã e venceram as heresias, ganharam guerras e esmagaram revoluções. Imitemos seu exemplo, nesta nossa época certamente mais grave do que a de Lepanto.
9) Que a Virgem Santíssima, Senhora Nossa e Auxiliadora dos Cristãos, condescenda em ouvir as nossas orações, e em apresentá-las ao seu Divino Filho, junto ao Qual é Medianeira necessária e sempre ouvida. Digne-se Ela iluminar os nossos eleitores para, que tenhamos neste Estado do Rio de Janeiro autoridades civis conformes aos desígnios de seu Imaculado Coração.
Campos, 24 de maio de 1958
Mons. Joaquim Thaumaturgo Coimbra de Albuquerque
Secretario do Bispado
VERBA TUA MANENT IN AETERNUM
• Colocar-se em corajosa oposição às preferências de muitos, ainda que se pareça fora de moda
PIO XII: Devem os Superiores dos Estados de Perfeição haurir ininterruptamente os princípios que os inspiram, não no que diz a maioria, ou no que se difunde — rejeitando os comentários mais antigos dos Padres — como o que deve ser exclusivamente ensinado e mandado agora, porque mais recente, ou no que agrada mais aos que vivem no século, mas antes na pura fonte da verdade revelada e na disciplina do Magistério eclesiástico. Com real coragem é necessário colocar-se em oposição às preferências de muitos; se o Superior não consente em parecer por vezes fora de moda para alguns, como conservará intacta a verdade de Cristo, sempre nova, é certo, mas ao mesmo tempo sempre antiga? — (Discurso aos Superiores Gerais das Famílias Religiosas, de 11-II-1958).
• Intenções para o Jubileu das Aparições de Lourdes
PIO XII: Nossas intenções são as seguintes: implore-se de Deus misericordiosíssimo que os que se separaram da verdade cristã — única que pode dar luz aos espíritos e paz aos corações — voltem o mais breve possível a essa verdade e queiram apegar-se a ela; os pecadores, carregados com suas faltas e jazendo miseravelmente sob a escravidão do demônio, se purifiquem de suas manchas e retomem o bom caminho; todos os que são bons se santifiquem mais ainda; a concórdia, a paz sejam plenamente restauradas, tanto entre os indivíduos quanto entre as nações, e floresçam no mais alto grau; a Igreja, enfim, goze por toda parte da liberdade necessária para o cumprimento de sua missão, a fim de estar em condições de prover, da maneira mais conveniente e pronta, à salvação eterna dos homens e de concorrer para a obtenção e o desenvolvimento de uma verdadeira prosperidade geral. — (Constituição Apostólica "Un siècle s'est écoulé", de 1.°-XI-1957).
• A Igreja empenhou-Se pelas CC.MM. e com as CC.MM. a ponto de causar surpresa a alguns
PIO XII: Não se pode negar que a Igrejas Se empenhou por vós e convosco até o ponto de suscitar a surpresa de alguns que não conhecem vossa gloriosa história e, especialmente, ignoram a vontade resoluta da congregada mariana exemplar de tudo ousar a fim de que nada seja omitido do que se mostra útil à maior gloria de Deus, à sua própria santificação pessoal e à salvação das almas. Nossas palavras serão pois breves, caras filhas: não se trata, aliás, de procurar novos princípios, de vos indicar novos fins, de vos ditar normas novas; e é supérfluo repetir com quanta esperança e com quanta confiança olhamos para as Congregações Marianas como uma das forças vivas que, silenciosamente o mais das vezes, mas eficazmente, trabalham na vinha do Senhor.
Quando dizíamos que sois uma "Ação Católica" pleno jure, queríamos, é certo, dar às vossas regras e às vossas obras o reconhecimento que merecem; mas tencionávamos sobretudo exortar-vos a uma ação generosa e orgânica em estreita união com a Hierarquia sagrada. — (Discurso às Congregações Marianas Femininas da Itália, de 26-IV-1958).
• Povos, leis e civilizações devem conformar-se aos ensinamentos e desígnios de Jesus Cristo
PIO XII: O próprio Verbo de Deus, que presidiu à criação de todas as coisas visíveis e invisíveis, encarnou-se para levar a termo a obra empreendida no começo dos tempos, de sorte que, tal como "nada foi feito sem Ele" e "nEle estava a vida, e a vida era a luz" (João 1, 3-4), do mesmo modo não pode haver verdade, bondade, harmonia e vida que não conduzam a Cristo, senhor, sustentáculo e exemplo dos homens. Oh! se estes reconhecessem a realidade da palavra de Cristo: "Eu sou a luz do mundo", se eles aceitassem toda a sua extensão sem barreiras ou limites, se eles expusessem o espírito e o coração aos seus raios divinos, que vida intensa, quanta serenidade e esperança floresceriam neste vale! Ao contrário, se tragédias íntimas dilaceram os espíritos, se o cepticismo e o vazio secam tantos corações, se a mentira se torna uma arma de luta, se o ódio assola as classes sociais e os povos, se as guerras e as revoltas se sucedem de um meridiano ao outro, se crimes se perpetram, se fracos são oprimidos e inocentes encadeados, se as leis não bastam, se os caminhos da paz são impraticáveis, se, numa palavra, este vale é ainda sulcado por torrentes de lágrimas, apesar das maravilhas realizadas pelo homem moderno, sábio e cultivado, isto é sinal de que algo é subtraído à luz esclarecedora e fecundante de Deus. Seja, pois, o fulgor da Ressurreição um convite aos homens para voltarem à luz vivificante de Cristo, conformando a seus ensinamentos e desígnios o mundo e tudo o que ele contém: almas e corpos, povos e civilizações, suas estruturas, suas leis, seus projetos. Não sejam eles impedidos de fazê-lo, nem pelo orgulho insensato, nem pelo temor vão de ver diminuída sua liberdade ou sua autonomia de ação, caso se deixem inspirar por Cristo. — (Mensagem Pascal de 6-IV-1958).
• Péssimo serviço prestam ao operariado os que pretendem defendê-lo com a linguagem dos socialistas
BENTO XV: Trabalhariam pessimamente pelo bem do operário — convençam-se disto — os que, ostentando a pretensão de melhorar-lhe as condições de existência, não lhe dessem a mão senão para a conquista dos bens frágeis e perecíveis desta terra, negligenciassem esclarecê-lo sobre seus deveres à luz dos princípios da doutrina cristã, e chegassem mesmo ao ponto de excitar sempre mais sua animosidade contra os ricos, entregando-se a essas declamações amargas e violentas por meio das quais nossos adversários impelem as massas para a subversão da sociedade.
Para afastar perigo tão grave, será necessário, Venerável Irmão, vossa inteira vigilância. Prodigalizando vossos conselhos — como já o tendes feito — aos que visam diretamente melhorar a condição do operário, vós lhes pedireis que evitem as intemperanças de linguagem que caracterizam os socialistas, e penetrem profundamente de espírito cristão toda a sua ação, quer tenda a realizar, quer a propagar tão nobre programa. Se este espírito cristão faltar, sem falar no mal incalculável que esta ação acarretaria, certamente dela não resultaria benefício algum. Seja-Nos licito esperar que todos sejam dóceis às vossas instruções; se alguém se mostrar obstinado, removei-o sem hesitação do cargo que lhe estiver confiado. — (Carta "Soliti Nos" a Mons. Marelli, Bispo de Bergamo, de 11-III-1920).
• Impossível gozar de todas as comodidades deste século sem minguar no espírito de fé
Pio XII: Cumpre que quem quer viver para o Senhor e servi-Lo perfeitamente seja, em seus afetos, de todo estranho ao mundo. O Senhor não pode ser servido perfeitamente se não se Lhe serve com exclusividade. Que bem criado, com efeito, poderia ser de algum modo comparado — não dizemos igualado — à perfeição divina? De que forma quem não purificou o espírito e não o conserva imune do orgulho do mundo e de suas múltiplas concupiscências, pode ascender até Deus, como que pelas asas de um livre amor, e viver unido a Ele? Unido, em verdade, não somente pelo laço vital da graça santificante, mas também por este amor ardente, próprio a quem tende para a perfeição?
A menos que pertença ao número dos perfeitos que são prevenidos por uma graça não comum, que homem — moralmente enfraquecido pelas consequências do pecado original — poderá libertar-se inteiramente de todo apego às coisas terrestres se não se separar realmente delas até certo ponto, tendo mesmo a coragem de abster-se por completo? Excetuado o caso de um encargo assumido na Igreja por obediência, ninguém pode gozar de todas as comodidades de que é pródigo este século, conceder-se os divertimentos e alegrias sensíveis tão largamente oferecidos em nossos dias a nossos contemporâneos, sem perder algo do espírito de fé, do amor a Deus. E muito mais, quem tiver tolerado mais demoradamente o relaxamento em sua vida, abandonará aos poucos os esforços para a santidade e se exporá ao perigo de ver baixar o fervor de sua caridade e a própria luz de sua fé, a ponto de decair lamentavelmente do estado elevado para que tendia. — (Discurso aos Superiores Gerais das Famílias Religiosas, de 11-II-1958).
OS CATÓLICOS INGLESES DO SÉCULO XIX
CREDO IN NEWMAN!
Fernando Furquim de Almeida
0 Movimento de Oxford teve início, como vimos, com o sermão sobre a "Apostasia Nacional", pronunciado pelo pastor Keble a 14 de julho de 1833, depois que o governo inglês foi obrigado por O’Connell a suprimir algumas dioceses anglicanas da Irlanda.
Foi bastante grande, nos meios protestantes, a repercussão desse sermão. De modo geral, a igreja anglicana perdera, a esse tempo, qualquer preocupação religiosa, e se transformara em mero organismo governamental. Essa sua sujeição ao poder temporal fora facilitada pela atitude displicente dos altos dignitários eclesiásticos, mas acabou por provocar amplo descontentamento nas várias camadas da opinião pública; nas mais conscientes, um desejo de reagir contra esse estado de coisas. A Universidade de Oxford, baluarte do protestantismo britânico, colocou-se então à frente dos descontentes, procurando pelo menos restaurar os estudos de Teologia, que tinham sido completamente abandonados. Os professores mais jovens fizeram suas as aspirações dos estudantes que desejavam uma renovação da vida religiosa na Inglaterra, e conseguiram ressuscitar o gosto pela Teologia nos meios intelectuais. Foi nestes últimos que o sermão de Keble teve maior ressonância, obrigando-os a uma tomada de posição.
Poucos dias depois, a 25 de julho, outro pastor influente, Rose, reuniu em seu presbitério o teólogo anglicano William Palmer, do Worcester College de Dublin, Perceval, filho de um par do reino e capelão dos dois últimos reis, e Froude, o mais brilhante dos jovens professores de Oxford. Rose propôs que, em carta ao Arcebispo de Canterbury, juntamente com protestos de fidelidade às autoridades eclesiásticas, se insinuassem as modificações que se julgava indispensável introduzir na vida religiosa do país. Essa carta seria assinada pelo maior número possível de pastores e obrigaria a hierarquia a rever as suas posições. William Palmer, porém, não acreditava na eficácia da carta, e sugeriu como substitutivo a criação de uma associação que reunisse todos os eclesiásticos de "boas idéias". O choque de opiniões entre Rose e Palmer foi acentuado pela exuberância de Froude, que, não aceitando nenhuma das propostas, mostrou a absoluta impossibilidade de conciliar o protestantismo tradicional com os ideais que animavam os seus colegas de Oxford. A reunião se dissolveu sem nenhum resultado prático.
Ao voltar à Universidade, profundamente desanimado, Froude encontrou em John Newman o entusiasmo que tinha perdido. Newman também achava que as medidas lembradas por Rose e Palmer seriam inoperantes, mas estava decidido a atender ao apelo de Keble. E iniciou a publicação de folhetos, a princípio anônimos, onde, sob o título geral de "Tracts for the times", eram expostas as idéias renovadoras que circulavam em Oxford. Esses folhetos eram distribuídos em todos os presbitérios por propagandistas que percorriam a Inglaterra a cavalo. O êxito da iniciativa trouxe-lhe novos colaboradores. Keble, Pusey e muitos outros aderiram ao movimento iniciado por Newman, e este se tornou o líder da campanha pela revisão da teologia anglicana. Os folhetos foram pouco a pouco perdendo seu caráter de propaganda e transformando-se em verdadeiros tratados. Em parte deve-se a eles a formação do ambiente que favoreceu as inúmeras conversões à Fé verdadeira que assinalaram a história religiosa da Inglaterra no século XIX.
Newman, que era professor do Colégio Oriel, foi alma do Movimento de Oxford e pretendia dedicar-lhe toda a sua vida. Mal poderia imaginar que poucos anos depois a obra praticamente se dissolveria, com a passagem de quase todos os seus membros para o Catolicismo.
Além da redação dos "Tracts", Newman iniciou uma série de conferências na capela de Saint Mary, que então só servia para nela se reunirem o vice-chanceler a os professores enquanto esperavam a organização dos cortejos acadêmicos. A assistência a essas conferências foi crescendo, e mesmo de outros colégios acorriam ouvintes atraídos pelo renome de Newman.
Um dia, um barulhento professor de Balliol foi levado por um amigo a Saint Mary. Era William George Ward. Capaz de grandes entusiasmos e dotado de uma sinceridade rude, com uma voz que dominava qualquer auditório, Ward transformou a conferência num debate, e dela saiu convencido. Entregou-se completamente ao movimento e foi, depois de Newman, o mais importante dos seus membros. A quem lhe perguntasse quais eram suas crenças, costumava responder: "Credo in Newmanum!". Mas, com a mesma sinceridade com que afirmava sua adesão, não titubeava em apartear Newman com objeções que davam vida às conferências, tanto mais que o aparteante seduzia o auditório com sua voz sonora, seu bom humor habitual e a paixão com que discutia. Mais coerente que o seu mestre, o menos que se pode dizer de Ward é que, sem ele, a conversão maciça do Movimento de Oxford não se teria feito tão cedo.
Newman e Ward colocar-se-ão em campos opostos depois de convertidos. O segundo será um dos campeões do ultramontanismo, no que não será acompanhado pelo seu antigo chefe. Já nas conferências de Saint Mary, Newman não suportava a lógica implacável do "fellow" de Balliol, cujos repetidos apartes o obrigavam a ir mais longe do que desejava. Por isso chegou ao ponto de pedir ao sacristão que não dispusesse as cadeiras da capela de frente para o orador, mas de lado, como as estalas de um coro, para não ver Ward enquanto falava.
As divergências entre ambos se tornarão agudas bem mais tarde. Enquanto permaneceram protestantes, trabalharam juntos, e foi a união entre eles que permitiu o êxito incomparável desse Movimento de Oxford. Iniciado com o intuito de reerguer a igreja anglicana, o movimento levou ao Catolicismo todos os que, graças a ele, estudaram melhor os fundamentos de sua fé.
NOVA ET VETERA
OS QUE SE SERVEM DA IGREJA
J. de Azeredo Santos
A 21 de abril de 1909, por ocasião do oitavo centenário de Santo Anselmo, publicou São Pio X a Encíclica "Communium Rerum", na qual, ao fazer o paralelo do que se passava ao tempo daquele grande Arcebispo e o que acontece em nossa atribulada época, profligou os espíritos acomodatícios que fecham os olhos à realidade que os cerca. Segundo esses tais, apesar de alguns pequenos senões, tudo iria sempre às mil maravilhas para a Religião e para a humanidade. Entretanto, lembra São Pio X, "enganam-se singularmente aqueles que imaginam e esperam para a Igreja um estado isento de toda perturbação: a crer em seus sonhos, tudo aconteceria na medida de seus desejos, o poder religioso não mais veria levantar-se contra ele nenhuma oposição, gozar-se-ia sem perturbação dos encantos da paz". Tal atitude já seria suficientemente errada e perniciosa. Há, porém, outros que vão além, diz o Papa: "Mais grosseiro ainda é o erro quando, na falsa e vã esperança de obter essa paz, dissimulam-se os interesses e os direitos da Igreja, sacrificando-os a conveniências particulares,... e pactuando com o mundo que se acha todo inteiro mergulhado no mal (1 Jo. 5, 19) — tudo sob o pretexto de ganhar os fautores de novidades e de reconciliá-los com a Igreja. Mas desde quando pode haver acordo entre a luz e as trevas, entre Cristo e Belial? Sonhos de espíritos doentios, tudo isso: nunca se deixou de forjar leis quimeras, e não esperemos que se cesse de fazê-lo enquanto houver soldados laxos sempre prontos a fugir, lançando fora seus escudos ao ver o inimigo; enquanto houver traidores sempre ansiosos por pactuar com o inimigo, que nesse caso é o inimigo irreconciliável de Deus e dos homens".
Vil neutralidade
A tais posições lamentáveis vem se juntar aquela, segundo São Pio X, em que de modo particular a nossa época se compraz: e a apatia, que ele chama de vil, é a não menos censurável neutralidade de tantos católicos diante do mal e dos inimigos da Santa Igreja, é a indiferença com que muitos filhos de Deus encaram os progressos da Revolução que se alastra pelo mundo como imenso braseiro. Eis porque tudo se deve empreender "para que nossa época renuncie enfim à atitude nefasta na qual se compraz: na hora em que se move contra a Religião uma guerra tão cruel, não é permitido estagnar-se em uma vil apatia, permanecer neutro, arruinar os direitos divinos e humanos por compromissos suspeitos; urge que cada um grave em sua alma esta palavra tão preciosa e clara de Cristo: Quem não está comigo, está contra mim (Mat. XII, 30)".
Ora, esta Encíclica foi escrita há cerca de cinquenta anos atrás, quando ia acesa a campanha dos inimigos externos da Igreja, representados pelos anticlericais, e dos inimigos internos, representados pelos modernistas. Dir-se-ia, portanto, que não mais se aplicam à realidade dos tempos presentes.
Infelizmente, porém, o quadro continua o mesmo e até carregado de cores mais sombrias. É verdade que salta aos olhos dos que querem ver, e ainda recentemente a excelente revista de cultura católica "La Tradición", publicada com tanto zelo, perspicácia e denodo pelo Revmo. Pe. Hervé Le Lay (Tala, Província de Salta, Argentina), transcrevia em suas páginas um artigo de Sua Eminência o Sr. Cardeal Alfredo Ottaviani, aparecido no "Osservatore Romano" (número de 6 de fevereiro de 1958 da edição em castelhano, de Buenos Aires) e intitulado "Servir a Igreja, e não se servir dela". O trecho seguinte desse artigo parece ter sido destacado do texto daquela Encíclica de São Pio X:
"Não falo daqueles países — são imensos, são continentes — nos quais a Igreja é aprisionada e condenada à morte como seu Esposo Divino; penso em nossas próprias nações que se dizem cristãs, governadas talvez por católicos em maioria sobre os demais. Quantas ofensas cada dia e cada hora, das mais retumbantes às mais mesquinhas, das mais brandas às mais grosseiras, das mais mascaradas pela cortesia às mais abjetas! E em nosso próprio campo, quantas críticas, quanta indisciplina, para não falar de alguma traição! Há até católicos com autoridade que, na ordem política, ousam colocar-se ao lado dos que não só ofendem mas até Lhe inferem os mais graves golpes. Ao mesmo tempo, todos recorrem aos Clérigos com o intuito de servirem-se deles junto dos poderosos, e se fomenta assim uma desconfiança em relação aos homens da Eternidade transformados em agentes das coisas temporais. Não é este o modo de honrar a Igreja. Assim, pelo contrário, Ela é desonrada. Isto não é servir a Igreja: é servir-se dEla".
Como servimos a Igreja?
Se os inimigos da Igreja são tantos e tão fortes, a culpa, acrescenta o Cardeal Ottaviani, "é de nossa debilidade e de nossa vileza", como já havia acentuado São Pio X.
Segundo o ilustre Purpurado, servir a Igreja é isto e nada mais: "amar a nossa Mãe, defender a honra da Esposa de Cristo no mundo". E cabe aqui uma pergunta dolorosa: como A servimos? Pela nossa apatia, pelo nosso horror à luta, deixamos que o campo de batalha seja dominado pelo adversário? Pelo nosso falso espírito de transigência e de conciliação, estaremos colaborando para que os inimigos da Igreja se sirvam dEla a fim de apressar a realização de seus sinistros desígnios?
Eis a terrível pergunta que o Emmo. Cardeal Ottaviani deixa pairando no ar. Façamos um exame de consciência. E peçamos a Deus que nos dê bastante espírito de renúncia, de fortaleza, de verdadeiro amor à causa do bem, para que, servos inúteis, também nós colaboremos para apressar o advento do dia em que "a Igreja e a sociedade possam cantar de novo, o hino do resgate, da vitória e da paz".