| Dois pesos e duas medidas na perseguição político-religiosa contra "Resistência" | (continuação)

contra "Resistência", e em calúnias de todo o gênero contra as TFPs, noticiou num quadro de primeira página: "Gustavo Machado, o venezuelano com mais extensa e legendária história política do presente século, faleceu nesta madrugada em Caracas. .... Seu papel como fundador do Partido Comunista de Cuba, sua luta ao lado de Sandino na Nicarágua, assim como a tomada de Curaçao e sua posterior invasão da Venezuela em 1929 concedem-lhe um destacado lugar na história continental. Gustavo Machado abraçou a ideologia marxista, apesar de ter nascido num lar de famílias endinheiradas. Gozava de grande apreço e profundo respeito em todos os círculos do país".

"El Nacional", cujo proprietário mais conhecido, Miguel Otero Silva, recebeu em Moscou o prêmio Lenine em 1980, não qualificou como "paramilitares" as ações bélicas stricto sensu do falecido líder comunista, "em sua luta ao lado de Sandino na Nicarágua", "a tomada de Curaçao" e "sua posterior invasão da Venezuela". Não qualificou como intervenção em assuntos próprios de outros países "seu papel como fundador do Partido Comunista de Cuba" - partido que hoje ocupa ditatorialmente o poder - nem suas ações na Nicarágua. Pelo contrário, essas ações "lhe concedem um destacado lugar na história continental".

Abraçou a ideologia marxista, apesar de ter nascido num lar de famílias endinheiradas" - comenta o diário. Nenhuma alusão a alguma tensão ou conflito de família por haver abraçado uma ideologia que postula o ódio de classes e, portanto, uma posição violentamente crítica da burguesia capitalista a que pertenciam seus familiares. Nem sequer uma referência a que, como líder comunista, incitava continuamente a juventude inscrita no PC a que destruísse a estabilidade de todas as famílias, inclusive as próprias.

As páginas do mesmo matutino, pelo contrário, vituperavam a Associação Civil Resistência diariamente com ódio, tachando-a de paramilitar, de internacional, e de predispor os filhos contra os pais.

Na página D2, na secção "Información", "El Nacional" (18-4-83), ao noticiar a morte e testemunhos de várias personalidades sobre Gustavo Machado, comenta: "Todo o mundo político concorda em reconhecer em Machado sua honestidade e valentia pessoais, sua coerência revolucionária e apego a seus princípios ideológicos".

Não havia nessa "coerência revolucionária" e nesse "apego a seus princípios ideológicos" algum vestígio de fanatismo?

Contudo, segundo o mesmo diário, havia fanatismo nos cooperadores de "Resistência" quando eram consequentes em relação a seus ideais.

"El Nacional", o diário de maior circulação na Venezuela, lido por um público variadíssimo em seus modos de pensar, mas fundamentalmente de centro, utiliza, como vemos, dois pesos e duas medidas.

Personalidades e políticos da AD unem-se em coro e elogiam calorosamente o líder comunista

Os elogios dos membros da Ação Democrática ao ex-guerrilheiro e líder do PC venezuelano são calorosos. Suas afirmações manifestam certa conivência com a ideologia do falecido, mal velada por discrepâncias de caráter político.

Jaime Lusinchi, na ocasião candidato presidencial - hoje Presidente da Venezuela - sempre de acordo com "El Nacional" (19-7-83), "disse lamentar profundamente o falecimento do líder comunista, ao qual qualificou como um lutador social e político". Afirmou: "Foi um homem fiel a suas ideias, valente em sua expressão, - e por cima de todas as coisas, um homem cabal. Gustavo tinha uma grande condição humana .... Meu carinho para com ele era verdadeiro e certo. Gustavo forma parte da consciência venezuelana destes tempos, e isto ninguém poderá retirar-lhe".

O atual chefe do Executivo, cujos dois ministros declararam "Resistência" ilegal por ter ela uma posição "antagônica ao que é a tradição do modo de ser venezuelano", admira como "parte da consciência venezuelana" o discípulo e porta-voz submisso de Moscou. Sem entrar em maiores análises, nota-se, a prima facie, uma grande incoerência...

O presidente da AD e presidente honorário da Internacional Socialista desde que tal partido foi aceito como membro pleno deste organismo transnacional, Dr. Gonzalo Barrios, "opinou que Machado foi um exemplo de lealdade a suas ideias". E foi mais longe: "e também um exemplo de lealdade a uma conduta reta, porque, ainda que não compartilhe suas ideias em matéria política, fui amigo pessoal dele e pude apreciar que é um homem íntegro em todo o amplo sentido desta palavra. Sua morte, na realidade, deixa um vazio, e ele merece ser recordado na Venezuela como um exemplo de lutador esforçado pela liberdade deste povo".

O ex-presidente venezuelano e atual vice-presidente da Internacional Socialista, membro da AD, Carlos Andrés Pérez, manifestou-se dizendo que participava da "dor nacional pela morte de um dos venezuelanos do século XX". (Note-se, não se trata de alguém alheio à "venezuelanidade" supostamente vulnerada por "Resistência"). "É um homem a quem devemos render tributo e homenagem pela lealdade de suas ideias, que sempre defendeu e estimulou em todas as atividades de sua vida. Tivemos momentos de grande confrontação, mas Gustavo Machado sempre se distinguiu pela fidalguia de um homem que tinha consciência do que ele era, do que ele significava, sobretudo do grande respeito que ele sentia pelas suas próprias ideias. Por isso a morte de Gustavo Machado, acima das bandeiras políticas, devemos senti-la como todos os venezuelanos que lutamos pela liberdade e dignidade do nosso povo".

Os três senadores da AD têm um ponto em comum: além de reconhecer sua "lealdade", louvam-no como "um grande lutador social e político", "esforçado pela liberdade deste povo" e "pela liberdade e dignidade de nosso povo". Aí está o substrato de concordância ideológica entre os partidários do socialismo.

No convite para o enterro, entre outros membros da AD e junto com o Cardeal José Ali Lebrún, assinam como "amigos" Carlos Andrés Pérez, Jaime Lusinchi, Simón Alberto Consalvi (atual Ministro da Secretaria da Presidência, que se manifestou hostil a "Resistência"), Carlos Canache Mata (atual chefe da fração parlamentar da AD), o qual também falou à imprensa contra a entidade católica e anticomunista.

É supérfluo estender as presentes considerações citando os elogios abertos e calorosos dos políticos de esquerda. São óbvios. Mas vale a pena ressaltar as palavras do comunista Eduardo Gallegos Mancera em seu discurso de despedida aos restos do "camarada", sem que se houvesse registrado nenhum protesto da audiência: "General te chamávamos, general te continuaremos chamando. Aqui estamos, teus soldados, para o que mandes. .... Guerrilheiro da pena, guerrilheiro do fuzil, não te esqueceremos jamais. Gustavo, vá em paz. Coroaremos tua obra".

A inflamada exortação - que concluiu com uma alusão ao uso do fuzil pelo correligionário comunista - não foi tachada por ninguém de "paramilitar"... Acusação que será lançada mais tarde pela boca de alguns dos ali presentes contra "Resistência", sem nenhum motivo.

Guarda de honra junto ao ataúde

Na sede do PC venezuelano, sobre a urna que contém os restos mortais de Gustavo Machado a bandeira com a foice e o martelo.

O artigo "Todo o país se uniu na despedida a Gustavo Machado", do "El Nacional" de 19-7-83, está ilustrado com fotografias do velório no Congresso. Fazem guarda de honra junto ao ataúde, entre outros, Jaime Lusinchi e Ernesto Cardenal, o sacerdote marxista Ministro da Cultura da Nicarágua.

O diário "El Nacional" relata a presença no velório dos embaixadores e representantes da Nicarágua, Granada, Cuba, União Soviética, Hungria, Rumânia, Checoslováquia, Polônia e Alemanha Oriental. Se consideramos que também em Granada governava então um comunista, vê-se o reconhecimento de qual é a "nacionalidade" dessa "venezuelanidade" de Gustavo Machado.

Depois do fechamento de "Resistência", mais honras a outro líder comunista venezuelano

Anúncio fúnebre publicado na imprensa pelo então Presidente da República, Luis Herrera Campins e seu ministério, comunicando a morte de Gustavo Machado.

Em data recente, 4 de janeiro deste ano, faleceu o líder do Partido Comunista Venezuelano, Ernesto Silva Tellería, cofundador desse partido em 1931.

O Presidente Jaime Lusinchi e seu Conselho de Ministros emitiram um decreto de luto por "quem foi um honesto lutador social, consequente em suas ideias, e que participou em grandes jornadas contra a tirania, e no processo e afirmação de nossa democracia" ("El Diario" de Caracas", 5-1-85, p.9).

O Presidente Lusinchi assistiu ao velório na sede do Partido Comunista da Venezuela, onde rendeu guarda de honra ante o ataúde, que estava adornado com uma bandeira com a foice e o martelo, e debaixo a inscrição "Comitê Central - Partido Comunista da Venezuela". O mandatário, no que "El Nacional" qualificou de "galhardo gesto", foi guardião de honra no momento da despedida do féretro.

Ao voltar ao Palácio do Governo, o Presidente afirmou: "Foi um lutador consequente com suas ideias, e isso é não só profundamente respeitável, como também necessário. Nesta medida constitui um exemplo para a gente de hoje. Venezuela perdeu um magnífico cidadão" ("El Diario de Caracas, 6-185).

"El Universal" (6-1-85) traduz de modo mais completo a declaração de Lusinchi: "A morte do Doutor Ernesto Silva Tellería constitui uma grande perda para o país, já que foi um consequente lutador por suas ideias e isso é não só profundamente respeitável como também necessário. Nessa medida ele constituiu um exemplo. Era um homem autêntico em todo sentido, e no que a mim pessoalmente se refere, éramos bons amigos. De maneira que a Venezuela perdeu um magnífico cidadão, e por isso o visitei em minha condição de Presidente da República, e também como amigo, para render-lhe homenagem de despedida, pois foi grande amigo meu".

Subscrevem o convite ao enterro, como "amigos", entre outros: Jaime Lusinchi, Simón Alberto Consalvi e... dois Bispos: D. Francisco José Iturriza, Bispo de La Guaira, e D. Ovidio Perez Morales, Bispo de Coro.

- Ernesto Silva Telería, membro destacado do Partido Comunista da Venezuela, falecido em janeiro último.

- Anúncio fúnebre publicado na imprensa pela Corte Suprema de Justiça comunicando o falecimento de Ernesto Silva Tellería e expressando suas condolências aos familiares do extinto. Segundo o diário "El Nacional", de 6 de janeiro último, o "Presidente Lusinchi [à esquerda, na foto], com um galhardo gesto, assistiu ao velório e foi guardião no minuto de despedida" de Ernesto Silva Tellería.

Em que consiste, para os dirigentes social-democratas, a "venezuelanidade" do PC?

Fizemos um apanhado das declarações destas personalidades, algumas das quais estão hoje no governo ou integram o Congresso Nacional da Venezuela, para destacar o fato de que, no recente estrondo publicitário contra a Associação Civil Resistência que redundou no arbitrário decreto de proibição de suas atividades em 13 de novembro p.p., se utilizou até à saciedade o refrão de que "Resistência" destoava dos valores venezuelanos, do sentir nacional. Assim, no início desse artigo

destacamos algumas palavras do "veredito" de David Morales Bello na Comissão parlamentar de investigação, segundo o qual "Resistência" sustentaria ideais distantes do que viria a ser a "venezuelanidade".

Entretanto, a respeito desses dois proeminentes comunistas, fundadores e membros ativos de um partido que não esconde ser dirigido por Moscou e aderir a ideários enormemente afastados da noção do que é a Venezuela autêntica, majoritariamente católica e que forma parte da cultura ocidental, não existe a mesma condenação. Efetivamente, os ideais - ou melhor, as utopias - transnacionais de Marx nasceram na Alemanha, gozaram um doce exílio na Inglaterra, e fermentaram e se levaram a cabo na distante São Petersburgo, para serem irradiadas hoje, a partir do Cremlin moscovita, a todas as nações através dos partidos comunistas locais e seus "companheiros de viagem".

Essas utopias são o contrário da Venezuela de Nossa Senhora de Coromoto: buscam a implantação do ateísmo obrigatório num país majoritariamente católico. Buscam o estabelecimento de uma contínua luta de classes, numa nação eminentemente pacífica e cuja textura social gozou por muitos anos de uma harmonia que, se bem que tenha muitas deficiências, é louvável enquanto passível de melhora dentro da maior consonância. Buscam o confisco, a opressão, inclusive a guerra de guerrilhas como métodos aptos para o estabelecimento de um Estado de ditatorialismo ideológico, numa terra que se gloriou de, nos últimos 26 anos, ter governos respeitadores das legítimas diferenças de pensamento. Enfim, não se pode conceber algo de mais diametralmente oposto ao tipo humano venezuelano que as utopias apregoadas por estas figuras enaltecidas como cidadãos exemplares por aqueles que fecharam "Resistência".

De onde se poderia concluir que, ou as autoridades socialistas venezuelanas não foram sinceras e coerentes quando atacaram a entidade, e a alegada "anti-venezuelanidade" de "Resistência" foi um pretexto, ou, o que é muito mais grave, pensam que a verdadeira Venezuela é a Venezuela do comunismo.

Será plausível esta segunda dedução? É a pergunta que se poderia fazer àqueles que aplaudiram as medidas despóticas do atual governo contra "Resistência". Pensam realmente os opositores políticos de "Resistência", que qualquer comunista é autenticamente venezuelano, e qualquer anticomunista se desvia da venezuelanidade?

E se isto é verdade, pensam eles que o modo de entender essa venezuelanidade é o modo como o entendem os teóricos do comunismo?

A força da lógica nos impõe estas perguntas. A força dos fatos nos mostra, nas declarações mencionadas, qual é a resposta:

Para os dirigentes social-democratas os filhos de Lenin estão muito mais próximos da tão alardeada "venezuelanidade" desejada por eles, do que aqueles que com fidalguia, ufania e sem temer as represálias defenderam a Venezuela nascida da civilização cristã e baseada nos princípios imutáveis com que a Igreja Católica formou os povos do Ocidente.


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