Império Romano estavam desaparecendo rapidamente. Na Espanha, uma nova civilização começava a transformar-se pela fusão dos elementos raciais que formavam sua população. Por quase dois séculos os godos a tinham controlado inteiramente, e suas maneiras bárbaras e desprezo pelo saber ameaçavam grandemente fazer retroceder o progresso da civilização. Compreendendo que o bem-estar tanto espiritual quanto material da nação dependia da total assimilação dos elementos estrangeiros, Santo Isidoro pôs-se à obra de unir numa nação homogênea os vários povos que formavam o reino hispano-gótico. Para esse fim, utilizou-se de todos os recursos da religião e da educação. E seus esforços encontraram completo sucesso".(4)
Para isso dedicou especial atenção à educação da juventude, fundando vários colégios e seminários. Esses colégios eram verdadeiras universidades, das quais saíram homens ilustres como São Bráulio, depois arcebispo de Saragoça, e Santo Ildefonso, os quais posteriormente fizeram o catálogo das inúmeras obras de Santo Isidoro.
Enfim, Santo Isidoro fundou também vários mosteiros, nos quais a regularidade monástica e o louvor a Deus se faziam de modo exímio. Um dos primeiros atos de seu episcopado foi o de pronunciar um anátema contra qualquer eclesiástico que molestasse os mosteiros.
Para seus estudantes, escreveu "uma multidão de tratados, cuja extensão e profunda doutrina pasmam os maiores engenhos, porque abraçam todos os conhecimentos humanos daquela época, desde a mais sublime teologia até a agricultura e economia rural. A principal de suas obras, ou seja, os vinte livros das ‘Orígenes o Etimologías’, é uma verdadeira enciclopédia ou dicionário universal, que faz descobrir o raro e agudo engenho de seu autor, como também sua extraordinária erudição e assombroso trabalho de investigação".(5) Ele foi, assim, o primeiro escritor cristão a reunir, para os católicos, uma suma dos conhecimentos universais. Muitos fragmentos do estudo clássico foram preservados nessa obra, sem a qual teriam desaparecido irremediavelmente. A fama desse trabalho deu novo ímpeto aos trabalhos enciclopédicos, produzindo abundantes frutos nos subsequentes séculos da Idade Média.
No campo teológico, seus três livros Sentencias podem ser considerados a primeira Suma Teológica. Redigiu ainda para seus estudantes a obra De la diferencia de la propiedad de las palabras, como complemento para o estudo da gramática e retórica. E também as obras históricas La Crónica, La Historia de los Reyes de España e El Libro de los Varones eclesiáticos.
Mesmo as ciências naturais e o estudo do mundo físico deveriam fazer parte do currículo de seus colégios, pois afirmava que "não é coisa supersticiosa o conhecer o curso dos astros, os movimentos das ondas, a natureza do raio e do trovão, as causas das tempestades, dos terremotos, da chuva e da neve, das nuvens e do arco-íris".(6) De todas essas questões, trata em dois interessantes livros: De la naturaleza de las cosas — que dedicou ao rei Sisebuto, de quem foi amigo e conselheiro, e a quem incentivou em seus trabalhos literários — e Del Orden de las creaturas.
Além de combater a heresia ariana, que tinha penetrado profundamente na Espanha entre os visigodos, Santo Isidoro erradicou totalmente a dos "acéfalos", que foi morta em seu nascedouro.
"Como Leandro, ele teve a mais proeminente participação nos Concílios de Toledo e de Sevilha. Com toda justiça, pode-se dizer que foi em grande medida devido ao trabalho esclarecido desses dois ilustres irmãos que a legislação visigótica, que procedeu desses concílios, é vista por historiadores modernos como exercendo a mais importante influência nos começos do governo representativo".(7)
Em dezembro de 633, se bem que avançado em anos, Santo Isidoro presidiu o IV Concílio de Toledo, do qual participaram todos os bispos da Espanha. Ele foi a origem da maior parte de seus decretos, como por exemplo, o que determinava a todos os bispos que estabelecessem seminários em suas dioceses para a formação do clero, na linha dos colégios fundados por ele em Sevilha. Desse modo, Santo Isidoro foi a mola propulsora do movimento educativo que teve Sevilha como centro. Empenhou-se também para que fossem promulgados 74 cânones, muito úteis para a explicação da fé e o restabelecimento da disciplina da Igreja. A pedido dos padres conciliares, trabalhou num novo missal e breviário para unificar os costumes e a liturgia em todo o reino: "Seria um absurdo que tivéssemos distintos costumes os que professamos uma mesma fé e formamos parte de um mesmo império", costumava dizer.
Também nesse IV Concílio, a pedido do rei Sisenando, deu forma à constituição política do reino, consolidando o regime de estreita união entre os poderes civil e religioso, e amoldando a legislação com base nos princípios do Direito Canônico. Foi o primeiro a assinar o decreto que mudava a Sé metropolitana de Cartagena para Toledo, a nova capital visigótica.
Nesse concílio ainda foi incentivado o estudo do grego e do hebreu, bem como das artes liberais. O Santo arcebispo suscitou também o interesse pelo direito e pela medicina, muito antes dos árabes, e despertou o interesse pela filosofia grega, introduzindo Aristóteles entre seus conterrâneos.
Isidoro faleceu em 636. Foi o último dos antigos filósofos cristãos, tendo sido cognominado "luminar esplendoroso e incorruptível" por São Bráulio de Saragoça. Indubitavelmente, ele foi o homem mais sábio de sua época, tendo exercido, como vimos, profunda influência em todo o sistema educativo da Idade Média. Seu discípulo São Bráulio o via como um homem suscitado por Deus para salvar o povo espanhol da avalanche de barbárie que ameaçava a civilização na Espanha. Diz ele: "Teus livros nos levam à casa paterna, quando andamos errantes e extraviados pela cidade tenebrosa deste mundo. Eles nos dizem quem somos, de onde viemos e onde nos encontramos. Eles nos falam das grandezas da pátria e nos dão a descrição dos tempos. Ensinam-nos o direito dos sacerdotes e das coisas santas, a disciplina pública e a doméstica, as causas, as relações e os gêneros das coisas, os nomes dos povos e a essência de quanto existe no Céu e na Terra".(8)
O VIII Concílio de Toledo, reunido em 653, denominou-o "Doutor insigne de nosso século, novíssimo ornamento da Igreja católica, o último na ordem dos tempos, mas não na doutrina; o homem mais douto nestes críticos momentos de fim das idades".(9)