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| PALAVRA DO SACERDOTE | (continuação)

digo de Direito Canônico estabelecer, no cânon 129, que somente “quem recebeu a ordem sagrada é capaz, segundo as normas do direito, do poder de governo, que por instituição divina existe na Igreja, e que também é chamado poder de jurisdição”.

Mulheres estão excluídas do estado clerical

Na legislação pré-conciliar, entrava-se no estado clerical a partir da tonsura — que era a cerimônia religiosa em que o bispo dava um corte no cabelo do futuro sacerdote, geralmente acompanhada da recepção da batina. A partir do novo Código, a pessoa torna-se clérigo com a recepção da ordem do diaconato.

Convém notar que as mulheres estão excluídas do sacramento da Ordem e do estado clerical por vontade manifesta de Nosso Senhor, que escolheu seus Apóstolos (e estes seus colaboradores) exclusivamente entre homens. Essa é uma doutrina irreformável, conforme ensinado por João Paulo II na Carta Apostólica Ordinatio sacerdotalis, que começa com a seguinte sentença:

“A ordenação sacerdotal, pela qual se transmite a missão, que Cristo confiou aos seus Apóstolos, de ensinar, santificar e governar os fiéis, foi na Igreja Católica, desde o início e sempre, exclusivamente reservada aos homens.”

E, depois de recordar as passagens das Sagradas Escrituras e dos documentos do magistério tradicional, ele afirma categoricamente:

“Portanto, para que seja excluída qualquer dúvida em assunto da máxima importância, que pertence à própria constituição divina da Igreja, em virtude do meu ministério de confirmar os irmãos (cfr. Lc 22,32), declaro que a Igreja não tem absolutamente a faculdade de conferir a ordenação sacerdotal às mulheres, e que esta sentença deve ser considerada como definitiva por todos os fiéis da Igreja.”3

Órgãos da Cúria sempre foram dirigidos por cardeais

Como se aplica todo o anterior aos dicastérios vaticanos, ou seja, seus organismos de governo? Os órgãos da Cúria Romana são auxiliares do Papa no governo da Igreja e não possuem um poder de jurisdição próprio (como os bispos nas suas dioceses), mas recebem uma jurisdição vicária do poder universal e supremo das chaves que caracteriza o papado (“de maneira que ela [a Cúria] não tem autoridade alguma nem poder algum além dos que recebe do Supremo Pastor”4, afirma a Constituição Apostólica Pastor Bonusde João Paulo II). Por isso mesmo, todos os órgãos da Cúria são juridicamente iguais entre si.

Os prefeitos dos diversos dicastérios são, dessa maneira, os mais próximos colaboradores do Papa no exercício de seu múnus docendi et regendi. Por isso, por mais de um milênio, os membros ordinários das congregações romanas eram exclusivamente cardeais escolhidos pelo Papa, aos quais se juntavam, nas reuniões plenárias, alguns bispos diocesanos igualmente nomeados pelo Papa.

O Prefeito era sempre um cardeal ou um arcebispo, no caso de alguns conselhos e ofícios pontifícios menores. Para o tratamento dos assuntos, eram recrutados oficiais, todos eles clérigos, assim como outros colaboradores inferiores, incluídas algumas religiosas, para as tarefas puramente administrativas; e, para o estudo dos assuntos, uma equipe de consultores, podendo alguns destes serem leigos, quando a matéria o aconselhava. Mas os membros propriamente ditos dos dicastérios da Cúria Romana eram somente os cardeais e bispos.

Essa estrutura curial respeitava plenamente o princípio de que somente quem recebeu a ordem sagrada é capaz, na Igreja, do poder de governo. A Constituição Pastor Bonus de S.S. João Paulo II, sobre a Cúria romana, afirmava explicitamente que “os assuntos, que requerem o exercício do poder de governo, devem ser reservados àqueles que estão revestidos da ordem sagrada”5.

Perigosa ruptura com a disciplina tradicional da Igreja

Isso mudou radicalmente depois da Constituição Apostólica Praedicate Evangelium, publicada pelo Papa Francisco em março de 2022. Sob o pretexto de que o Papa, os bispos e outros ministros ordenados “não são os únicos evangelizadores na Igreja”, foi disposto “o envolvimento de leigos e leigas, mesmo em funções de governo e de responsabilidade” no seio da Cúria.

A justificação dessa ruptura com a disciplina tradicional foi dada pelo principal promotor da reforma, o jesuíta Pe. Gianfranco Ghirlanda, na conferência de imprensa de apresentação do documento. Ele afirmou que a autoridade do prefeito e do secretário de um dicastério, normalmente um cardeal e um bispo, “não provém do grau hierárquico recebido [pelo poder de ordem, na sagração episcopal], como se agissem com um poder próprio”, mas da missão canônica que receberam do Papa6.

Essa afirmação é tradicional e correta em si mesma, mas foi aplicada incorretamente. No seu aspecto tradicional, ou seja, na distinção entre o poder de ordem e de jurisdição, ela foi muito criticada pelos defensores de uma novidade introduzida pelo Concílio Vaticano II: para tentar justificar o princípio da “colegialidade episcopal” no governo universal da Igreja, os padres conciliares declararam que, na sagração episcopal, os novos bispos recebem diretamente de Cristo, com a plenitude do poder da ordem, também o poder de jurisdição. Essa afirmação conciliar vai contra o ensino tradicional de que dito poder é certamente recebido de Cristo, mas através da missão canônica outorgada pelo Papa, que detém a plenitude do poder das chaves e confia a um bispo o pastoreio de uma porção do rebanho.

Resultou uma trapalhada: o Papa tomou uma medida errada (a nomeação da Irmã Brambilla) com uma justificativa verdadeira e alguns críticos dessa medida tomaram uma atitude correta, condenando-a essa medida com uma justificativa errada.

De fato, o que está em ruptura com o ensino tradicional da Igreja não é o princípio verdadeiro, evocado pelo Pe. Ghirlanda, mas a violação da regra de que somente “quem recebeu a ordem sagrada é capaz, segundo as normas do direito, do poder de governo, que por instituição divina existe na Igreja”.

Em resposta datada de 8 de fevereiro de 1977, a Congregação para a Doutrina da Fé confirmou que, dogmaticamente, os leigos estão excluídos “dos ofícios intrinsecamente hierárquicos, cuja capacidade está vinculada à recepção do sacramento da Ordem”. Ora, essa regra dogmática de que somente os clérigos têm direito ao exercício público do poder no foro externo é parte da lei divina e da estrutura hierárquico-sacramental com a qual Jesus Cristo dotou sua Igreja. Ela é, portanto, imutável.

Como resolver a quadratura do círculo?

Alguém poderá alegar que, no passado, houve “abadessas mitra-

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